Fed deve fazer último corte de juros do ano em outubro

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O presidente do Federal Reserve (Fed, o banco central norte-americano), Jerome Powell. Foto: Divulgação/ Federal Reserve

Por Gustavo Nicoletta

São Paulo – O Federal Reserve, banco central dos Estados Unidos, vai reduzir a taxa básica de juros do país em 0,25 ponto porcentual (pp) amanhã, para a faixa de 1,50% a 1,75% ao ano, e encerrará assim o afrouxamento preventivo da política monetária, segundo as previsões de especialistas consultados pela Agência CMA.

HISTÓRICO DA TAXA DE JUROS DOS EUA

Segundo o estrategista sênior do Rabobank para os Estados Unidos, Philip Marey, nas ocasiões anteriores em que o Fed decidiu reduzir os juros preventivamente, fez isso com três cortes nas taxas. Em 1998 foram três reduções seguidas, e em 1995-96 foram um corte de 0,25 pp em julho, seguido por dois cortes da mesma magnitude em dezembro e em janeiro.

“Com este histórico de cortes preventivos em mente, o Fed pode querer indicar ao mercado que os obstáculos a um quarto corte são muito altos e que os juros provavelmente continuarão inalterados”, afirmou Marey, acrescentando que isso poderia decepcionar o mercado.

Segundo dados compilados pelo CME Group com base em contratos futuros de juros, o mercado aposta de forma quase unânime que o Fed reduzirá a taxa básica em 0,25 pp na quarta-feira e não fará alterações na política monetária em dezembro.

A partir de janeiro do ano que vem, porém, começam a crescer gradualmente as apostas em um corte nos juros, e em junho de 2020 há mais investidores esperando uma redução do que a manutenção ou o aumento das taxas. “Escolher as palavras certas no comunicado e na entrevista coletiva de [Jerome] Powell, portanto, será um desafio”, disse Marey.

Há elementos que podem impedir o Fed de cortar os juros, embora o mercado considere esta possibilidade remota. Neste grupo está a ausência de desdobramentos negativos da guerra comercial entre Estados Unidos e China nas últimas semanas.

“Embora a situação do comércio não tenha melhorado significativamente, alguém pode argumentar, com razão, que ela não piorou desde a última reunião”, em setembro, disseram analistas do Wells Fargo em um relatório. “Será que um mês sem piora vai segurar a mão do comitê?”

O banco argumenta também que o custo dos cortes preventivos nos juros está crescendo. “Os objetivos primários do Fed são de inflação baixa e estável e de máximo emprego. O mercado de trabalho está em forma. Embora seja verdade que o ritmo de crescimento do emprego está diminuindo, isso é algo a se esperar quando a taxa de desemprego está no menor nível em 50 anos”, afirmou.

Para o Wells Fargo, o mercado de trabalho aquecido está abrindo caminho para o aumento dos salários, embora isso ainda não tenha efetivamente se traduzido em uma inflação muito maior que a meta de 2% do Fed.

“As autoridades do Fed podem avaliar o cenário no contexto de seu mandato e questionar se juros ainda menores são o que a economia precisa mais neste momento”, acrescentou.

BALANÇO

Outro elemento que chamará a atenção amanhã serão os comentários do Fed sobre o ritmo de crescimento do balanço da instituição. Até setembro, a instituição vinha encolhendo o tamanho do balanço, numa tentativa de drenar a injeção cavalar de recursos nos bancos feita pelo banco central desde a crise financeira.

Em 2008, o balanço do Fed era de aproximadamente US$ 900 bilhões, mas em 2015 atingiu um pico de US$ 4,5 trilhões, refletindo uma série de compras de títulos de dívida dos Estados Unidos promovidas pelo Fed para baixar as taxas de juros do mercado e, com isso, tentar reviver a economia do pós-crise.

Desde o ano passado, no entanto, o Fed vinha reduzindo gradualmente o tamanho do balanço, numa tentativa de normalizar a condução da política monetária.

VOLUME DE ATIVOS NO BALANÇO DO FEDERAL RESERVE

Em setembro, porém, quando o balanço atingiu cerca de US$ 3,7 trilhões, o mercado interbancário dos Estados Unidos ficou sem liquidez, forçando o banco central americano a promover operações compromissadas para evitar a disparada dos juros.

Posteriormente, o Fed indicou que voltaria a comprar títulos de dívida dos Estados Unidos para garantir liquidez no sistema bancário, mas negou que isso equivaleria a estímulos monetários como os que foram oferecidos pela instituição anteriormente.

Mesmo assim, o presidente do banco central, Jerome Powell, deve ser questionado sobre o assunto durante a entrevista coletiva que concederá amanhã, às 15h30.

O banco Nordea acredita que o Fed não esteja promovendo uma retomada dos estímulos monetários, porque considera que o objetivo do banco central norte-americano na verdade é garantir um nível adequado do chamado “excedente de reservas” mantido pelos bancos – que caiu de US$ 1,7 trilhão em setembro de 2018 para cerca de US$ 1,2 trilhão em setembro deste ano.

EXCEDENTE DE RESERVAS BANCÁRIAS NOS EUA

“As reservas bancárias são mantidas por motivo regulatório. Elas também servem como colchões de liquidez em tempos de turbulência. E é aí que muitas pessoas tendem a ficar confusas. Não há bilhões de excedente de reservas no sistema para amparar a liquidez? Bom, não. Não de verdade”, disse o banco em um relatório.

Segundo o Nordea, boa parte do que é considerado como “excedente de reservas” na verdade faz parte do capital que os bancos são obrigados a guardar por questões regulatórias, mas não se enquadra na definição de reservas prevista no acordo de Basileia.

Além disso, o banco aponta que mesmo se o balanço do Fed se estabilizasse, o “excedente de reservas” não necessariamente deixaria de cair. Isto porque o excedente faz parte do passivo do Fed, e neste passivo também há itens como o dinheiro em circulação e operações com outros bancos centrais, por exemplo, que podem ganhar espaço no balanço em detrimento do “excedente de reservas”.

O jeito mais fácil de elevar este excedente – e, com isso, a liquidez no sistema financeiro – seria a compra dos chamados T-bills – títulos de curto prazo da dívida dos Estados Unidos, segundo o Nordea. É esta linha de ação que o Fed adotou e que foi comparada aos estímulos monetários promovidos anteriormente – baseados na compra de títulos de médio e longo prazo.