Bolsa fecha em queda por temor à situação fiscal doméstica; dólar sobe

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São Paulo – A Bolsa fechou em queda em dia de forte aversão ao risco com os investidores cautelosos com o cenário político doméstico em meio à espera pela apresentação da Proposta da Emenda à Constituição (PEC) da Transição, que deve propor que o Auxílio Brasil [voltará a se chamar Bolsa Família] fique fora do teto de gastos por tempo indeterminado.

Somado a isso, os investidores ficam atentos à política econômica do novo governo eleito. E, mais cedo, a fala do vice-presidente eleito Geraldo Alckmin, sinalizando que deixará para discutir a âncora fiscal mais para frente causou mau humor no mercado.

As ações ligadas ao consumo e construção sofreram na sessão desta quarta-feira refletindo o estresse na curva de juros futuros com a intensificação das preocupações com o fiscal. Americanas (AMER3) caiu 9,80%; Magazine Luiza (MGLU3) perdeu 8,01% e MRV (MRVE) recuou 4,42%.

O destaque de queda ficou para os papéis da Hapvida (HAPV3), que caíram 10,93% pressionados pela alta dos juros futuros, investidores ainda digerindo o balanço do 3T22 na semana passada e a aprovação da emissão de 1,2 bilhão de debêntures para lastro de CRI.

Em contrapartida, os papéis da Embraer (EMBR3) subiram 9,93% após a aprovação de um crédito divulgado pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Sustentável (BNDES) para produção e exportação de aeronaves no montante de R$ 2,2 bilhões.

O principal índice da B3 caiu 2,57%, aos 110.243,33 pontos. O Ibovespa futuro com vencimento em dezembro perdeu 3,95%, aos 110.910 pontos. O giro financeiro foi de R$ 34,8 bilhões. Em Nova York, as bolsas fecharam em queda.

Fabricio Gonçalvez, CEO da Asset Management, comentou que os investidores estão cautelosos com as “incertezas em relação à política econômica que será implementada pelo do novo governo e a preocupação com a PEC de transição que tem risco fiscal envolvido”.

Caio Henrique Soares Rodrigues, head de renda variável da Rio Negro Investimentos, disse que o mercado interno está apreensivo e muito volátil e “passa a colocar no preço das ações o risco de uma política com menor responsabilidade fiscal, descuidando de temais importantes para a economia”.

Rodrigues acrescentou que o mercado tem acompanhado de perto a “Pec da Transição e a nomeação da nova equipe econômica”.

Piter Carvalho, economista-chefe da Valor Investimentos, disse que o dia foi de mau humor no mercado. “Os juros subiram mostrando que o Brasil pode ter um problema fiscal dado que o novo governo pretende aumentar os gastos, os R$ 175 bilhões fora do teto já reflete na curva de juros. O Brasil mostra incerteza e o mercado espera novos nomes para traçar os investimentos; a PEC deve vir grande, mas deve ir se desidratando aos poucos para passar pelo Congresso”.

Bruno Komura, analista da Ouro Preto Investimentos, disse que parte desse mau humor do mercado é atribuído à fala do Alckmin. “Ele [Geraldo Alckmin] disse que a questão da âncora fiscal vai ficar mais para frente”.

Luan Alves, analista-chefe da VG Research, disse que o mercado fica em “modo cautela com o cenário político local diante da PEC da Transição e o que deverá ser apresentado na proposta; o foco do mercado se volta para quem ficará à frente dos principais ministérios”.

O analista-chefe da VG Reserch comentou que as empresa expostas à economia domésticas estão “sofrendo e o fluxo tem ido para as companhias dolarizadas”.

O dólar comercial fechou em alta de 1,52%, cotado a R$ 5,3840. A sessão foi marcada por forte aversão ao risco, devido ao temor de descontrole fiscal e a indefinição sobre a equipe econômica de Lula (PT).

Segundo o economista-chefe da Infinity Asset, Jason Vieira, “a cada hora a sinalização só piora. Não saber quem vai conduzir tudo isso é um problema. Temos que esperar alguém falar de modo mais concreto”.

O analista da Ouro Preto Investimentos Bruno Komura explicou que apesar do vice-presidente eleito, Geraldo Alckmin PSB), prometer não ser “gastador”, o ex-governador de São Paulo também disse que a âncora fiscal não será discutida agora, e isso não foi bem visto pelo mercado, que está muito sensível.

De acordo com o sócio fundador da Pronto! Invest, Vanei Nagem, “o cenário lá fora está mais otimista. Aqui temos apenas especulações políticas. Não fosse isso, o dólar estaria a R$ 5,10”.

Para a economista do Banco Ourinvest Cristiane Quartaroli se por um lado os mercados estão mais otimistas com o relaxamento das medidas de combate à Covid na China, “mas por outro lado os ataques ocorridos na Polônia trazem aversão ao risco e preocupação para o mercado”, que pontua que o humor do mercado pode ser afetado a qualquer momento.

“Aqui no Brasil, a expectativa ficará por conta do anúncio da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) de Transição, bem como os nomes que farão parte da equipe ministerial a partir de 2023”, observa Quartaroli.

As taxas dos contratos futuros de Depósitos Interfinanceiros (DI) aceleraram o ritmo de alta. O driver hoje é interno, com as indefinições sobre a equipe econômica do presidente Lula (PT) e o temor de um descontrole fiscal em sua gestão. O DI para janeiro de 2023 tinha taxa de 13,716% de 13,696% no ajuste anterior; o DI para janeiro de 2024 projetava taxa de 14,030%, de 13,690%, o DI para janeiro de 2025 ia a 13,345%, de 12,915% antes, e o DI para janeiro de 2027 com taxa de 13,080% de 12,720%, na mesma comparação. No mercado de câmbio, o dólar operava em alta, cotado a R$ 5,3990 para venda.

Os principais índices do mercado de ações dos Estados Unidos fecharam a sessão em queda, com a Nasdaq caindo 1,5%, enquanto os investidores avaliavam o balanço trimestral da Target e seus impactos no setor varejista.

“As ações dos Estados Unidos caíram após uma rodada decepcionante de lucros, com as vendas no varejo superando as expectativas, o que sugere que a economia pode lidar com mais aumentos de juros”, explicam analistas da Oanda. “Membros do Fed observaram que 4,75% a 5,25% é uma faixa razoável para o banco central aumentar as taxas de juros, o que é um pouco maior do que o que os mercados monetários estão precificando.”

O balanço trimestral da Target fez as ações da empresa caírem 13,1% após um relatório de lucros que não atingiu as estimativas por uma ampla margem, além de uma orientação fraca para o próximo trimestre.A varejista foi pressionada por uma desaceleração nos gastos do consumidor com mercadorias e disse que os saques em lojas reduziram sua margem de lucro bruto em US$ 400 milhões até agora este ano.

“Nas últimas semanas do trimestre, as tendências de vendas e lucro diminuíram significativamente, com o comportamento de compra dos hóspedes cada vez mais impactado pela inflação, aumento das taxas de juros e incerteza econômica”, disse o presidente e CEO da Target, Brian Cornell, no comunicado de resultados. “Isso resultou em um desempenho de lucro no terceiro trimestre bem abaixo de nossas expectativas.”

A varejista também puxou para baixo outras empresas do setor. Macy’s caiu 7,8%, Nordstrom perdeu 8%, Kohl’s recuou 7% e a Gap teve queda de 6,2%.

Mais cedo, o Departamento de Comércio informou que as vendas no varejo saltaram 1,3% em outubro, com os americanos gastando mais com alimentos, gás e itens de grande valor no mês passado, apesar das pressões inflacionárias.

Uma impressão forte do consumo pode atrapalhar a tendência de alta do mercado, com os investidores provavelmente interpretando gastos robustos como um sinal para os membros do Federal Reserve (Fed, o banco central americano) de que aumentos agressivos de juros podem continuar.

As ações norte-americanas até o momento se mantiveram em alta nesta semana, depois que uma leitura mais leve da inflação na quinta-feira passa estimulou um rali de alívio. O Indice de Preços ao Produtor (PPI, na sigla em inglês) de outubro, outro indicador-chave da inflação, reacendeu esse otimismo na sessão da última terça-feira, juntamente com comentários de membros do Fed nos últimos dias.

Confira abaixo a variação e a pontuação dos índices de ações dos Estados Unidos após o fechamento:

Dow Jones: -0,12%, 33.553,83 pontos
Nasdaq 100: -1,54%, 11.183,7 pontos
S&P 500: -0,82%, 3.958,79 pontos

Com Paulo Holland e Darlan de Azevedo / Agência CMA.