Mercado financeiro está descolado da economia real, diz FMI

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A diretora gerente do Fundo Monetário Internacional (FMI), Kristalina Georgieva / Foto: Joshua Roberts/FMI

São Paulo – O otimismo do mercado financeiro mundial está descolado do que se observa na economia mundial, e isso aumenta as chances de queda nos preços dos ativos se o apetite por risco dos investidores diminuir, afirmou o Fundo Monetário Internacional (FMI) em um relatório.

Segundo relatório publicado pelo Fundo, o sentimento positivo dos investidores baseia-se na expectativa de que haverá medidas de apoio econômico e monetário por parte dos governos por causa das grandes incertezas a respeito da recuperação da economia.

“Os mercados parecem estar esperando uma recuperação rápida em forma de ‘V’ na atividade, conforme ilustrado pela forte recuperação no consenso de estimativas sobre o lucro das empresas do S&P 500. Dados econômicos recentes e indicadores de alta frequência, porém, sugerem uma fraqueza mais profunda que a esperada”, afirmou o FMI.

“Isto criou uma divergência entre a precificação do risco nos mercados financeiros e as perspectivas econômicas, conforme os investidores aparentemente apostam num apoio contínuo e sem precedentes pelos bancos centrais. Esta tensão pode ser ilustrada, por exemplo, pelo rali recente nos mercados de ações dos Estados Unidos, de um lado, e a queda acentuada na confiança do consumidor, por outro lado”.

“Este descolamento gera dúvidas sobre a potencial sustentabilidade do atual rali no mercado de ações não fosse a melhora no sentimento proporcionada pelo apoio de bancos centrais. Esta desconexão entre os mercados e a economia real gera o risco de mais uma correção no preço dos ativos de risco se o apetite por risco dos investidores diminuir, gerando uma ameaça à recuperação”, avaliou.

O FMI aponta que movimentos de recuperação nos mercados de ações após quedas bruscas nos preços já aconteceram antes durante períodos de significativa pressão econômica e depois foram desfeitos.

“Nos mercados de títulos corporativos, os spreads de companhias com graus de investimento estão relativamente contidos atualmente, ao contrário do aumento acentuado observado durante choques econômicos significativos anteriores. Na verdade, os valores de mercado parecem esticados em muitos mercados de ações e de títulos corporativos”, afirmou.

Nas contas do Fundo, a diferença entre os preços de mercado e o preço justo com base numa análise de fundamentos está perto de máximas históricas na maioria dos mercados de ações e de dívida de economias avançadas – como Estados Unidos, Japão, China, eurozona e Reino Unido, e o contrário acontece em muitos mercados de ações de economias emergentes – caso do Brasil.

O FMI aponta que uma série de gatilhos pode resultar numa reavaliação dos preços de ativos de risco, o que aumentaria a tensão no sistema financeiro.

“Por exemplo, a recessão pode ser mais profunda e mais longa do que a atualmente prevista pelos investidores. Pode haver uma segunda onda do vírus e as medidas de contenção podem ser retomadas. As expectativas do mercado sobre a extensão e a duração do apoio dos bancos centrais aos mercados financeiros pode ser otimista demais, levando os investidores a reavaliar o apetite por, e a precificação do, risco.”

“O ressurgimento de tensões comerciais pode azedar o sentimento do mercado, colocando a recuperação em risco. Finalmente, um aumento da tensão social em todo o mundo em resposta à crescente desigualdade econômica pode levar a uma reversão do sentimento dos investidores”, afirmou o FMI.