Lula propõe reforma da governança global: “tragédias humanitárias evidenciam a falência das instituições internacionais”

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O presidente Lula na coletiva de imprensa no G20, na Índia | Foto: Ricardo Stuckert/PR

São Paulo – O presidente Luís Inácio Lula da Silva, em discurso na Segunda Cúpula Virtual Vozes do Sul Global, realizada na manhã de hoje, convocou os países da região a lutarem pela paz, contra as desigualdades e a fome, além de propor avanços na reforma da governança global e a restituição da primazia do direito internacional e humanitário.

No início do discurso, Lula abrdou o conceito do Sul Global e outros usados para identificar os países do Hemisfério Sul economicamente. “Muitas vezes, adotamos sem refletir pontos de vista que não nos favorecem. Já fomos chamados de terceiro mundo e de países em desenvolvimento, fomos divididos em países emergentes e países menos desenvolvidos, em países de renda média e países de renda baixa. A quem questiono o conceito de Sul Global, dizendo que somos diversos demais para caber nele?”

Lula ressaltou os interesses comuns entre os países da região. “Mas existem muito mais interesses que nos unem, do que diferenças que nos separam. Assumir nossa identidade como Sul Global significa reconhecer que olhamos o mundo de uma perspectiva semelhante.”

“Ao longo de décadas trabalhamos juntos por um mundo mais equitativo. Agora temos que abraçar o desafio da paz”, pontuou.

O presidente brasileiro lembrou que a mobilização entre os países resultou nos objetivos do desenvolvimento sustentável, “mas só um quinto das suas metas estão progredindo como esperado, a implementação de um terço delas está estagnada ou regrediu.”

“Quando eu falei na tribuna da Assembleia Geral da ONU, em setembro, eu propus que assumirmos a redução das desigualdades como nosso objetivo síntese. Caso contrário, o abismo entre países ricos e pobres só iria crescer. Falharemos com as pessoas que passam fome, enquanto milhões de dólares são usados para travar guerras.”

Lula também ressaltou como os países do Sul Global são mais prejudicados. “Seremos os mais prejudicados pelas mudanças climáticas, mesmo sendo os menos responsáveis historicamente pelas emissões de gases de efeito estufa, nos tornaremos vítimas de nova corrida predatória por recursos naturais, incluindo minerais críticos, sem oportunidade de diversificar nossa economia. Viveremos o impacto da Inteligência Artificial sem participar da sua regulação. E boa parte de nós viverá sufocado por dívidas que limitam a capacidade de investimento do estado em nosso desenvolvimento sustentável”, disse.

Lula disse que a presidência brasileira do G20, que se inicia em dezembro, “irá lançar luz sobre as necessidades do Sul Global”, como o combate à fome e ao enfrentamento da mudança do clima, “que são as maiores urgências do nosso tempo.”

“E na COP30, que sediaremos no coração da Amazônia, insistiremos para que os países desenvolvidos assumam metas mais ambiciosas e cumpram os seus compromissos.”

Para avançar nesses temas, Lula argumenta que “será incontornável avançar na reforma da governança global”. “As tragédias humanitárias que estamos assistindo evidenciam a falência das instituições internacionais. Por não refletirem a realidade atual, elas perderam a efetividade e credibilidade.”

“Em seu mandato no conselho de segurança da ONU, o Brasil tem trabalhado incansavelmente pela paz. Mas as soluções têm sido reiteradamente frustradas pelo direito de veto.”

Por fim, Lula disse que é preciso “resgatar a confiança no multilateralismo” e “recuperar nossas melhores tradições humanistas.” “Nada justifica que as principais vítimas dos conflitos sejam mulheres e crianças. É preciso restituir a primazia do direito internacional, inclusive o humanitário, que valha igualmente para todos, sem padrões duplos ou medidas unilaterais.”

Por fim, disse que a intenção do Sul Global “não é ou não deve ser antagonizar o chamado Norte”, mas que “uma ordem internacional justa exige que todos nós tenhamos voz e falaremos mais alto se falarmos juntos.”