Expectativa de corte na Selic não é unânime, mas majoritária

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Por Olívia Bulla

São Paulo – A taxa básica de juros vai continuar em queda neste ano? Trata-se de uma pergunta cuja resposta não é unânime no mercado financeiro. Apesar da expectativa majoritária de corte de 0,25 ponto percentual (pp) na Selic em fevereiro, uma parte considera que o Comitê de Política Monetária (Copom) deveria parar o ciclo nos atuais 4,50%, diante do repique recente da inflação e do dólar acima de R$ 4,20.

Já o grupo majoritário que avalia que o Banco Central deve estender o processo de afrouxamento monetário neste mês se apoia nos dados fracos da atividade na reta final de 2019, que levantaram dúvidas sobre o ritmo da recuperação econômica doméstica. Para esse grupo, ainda há espaço para estímulos monetários adicionais, sem comprometer a meta de inflação de 2020, de 4%.

“A economia não está tão tracionada a ponto de provocar uma aceleração notável do crescimento neste ano”, observa o economista-chefe do Banco Fator, José Francisco de Lima Gonçalves. Para ele, as recentes declarações do presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, sinalizam que ele mesmo não espera uma expansão forte do Produto Interno Bruto (PIB). “E isso sugere juros ainda em níveis estimuladores”, emenda.

Além disso, o economista do Fator observa que as leituras mais recentes da inflação ao consumidor já indicam que o choque de preços nas proteínas deve se dissipar rapidamente, sem contaminar outros itens. Da mesma forma, ele avalia que a alta do dólar tampouco foi capaz de “desancorar” as projeções, que seguem situadas abaixo da meta. “A inflação corrente e as expectativas estão em território benigno”, diz Gonçalves.

NÃO É PARA TANTO

Mas há quem diga que a retomada da economia brasileira será lenta e gradual, mas não tão frágil, e que o cenário à frente para os preços não está tão favorável, o que justificaria maior cautela por parte do BC na condução da Selic. Ainda mais com um novo fator de incerteza vindo do exterior, em meio ao surto de coronavírus na China.

Além disso, uma parcela defende que mais importante do que ajustes adicionais na taxa Selic é considerar o tempo que o juro básico seguirá em nível baixo, com o Copom mantendo uma política monetária suave (“dovish”) e estável. Essa postura permitiria ao BC seguir vigilante em relação à inflação, sem comprometer a recuperação econômica.

“A economia vai continuar ganhando tração e vai crescer em ritmo mais forte. E essa aceleração sugere cautela para saber como vai respingar na inflação”, observa o economista-chefe da SulAmérica Investimentos, Newton Rosa. Ele lembra que a meta de inflação em 2021 é menor, de 3,75%. “Portanto, é mais desafiadora e qualquer coisa pode descolar”, pondera.

E se a inflação sair do controle, o cenário para o juro básico também estaria ameaçado. “Quanto mais estímulos agora, menor é o tempo para manter a Selic estável”, afirma Rosa. Nesse sentido, o ajuste de alta teria de ser antecipado, com o Copom tendo de subir a taxa básica mais cedo que o esperado. “Por isso, se mantiver a Selic agora, dá para ver o ritmo da retomada e se houver frustração, aí sim, pode voltar a cortar”, conclui o economista da SulAmérica.

E é justamente por causa da perspectiva de manutenção dos juros básicos por um período prolongado, até o fim de 2021, que a Selic deve ficar estacionada em 4,50%. “O mercado, por outro lado, antecipa um aperto monetário nos próximos 12 meses, o que pode prejudicar a retomada ainda fraca da atividade”, ressaltam os economistas para América Latina da Capital Economics (CE), William Jackson e John Ashbourne, em relatório.