“Descredibilidade da Argentina começou com a perda da independência do Banco Central”, diz Campos Neto

201
Presidente do Banco Central do Brasil, Roberto Campos Neto, participa da Comissão de Assuntos Econômicos (CAE), no Senado Federal, em Brasília. (Foto: Raphael Ribeiro/BCB)

São Paulo – O presidente do Banco Central (BC), Roberto Campos Neto, disse que a descredibilidade da Argentina começou com a perda da independência do Banco Central. A autoridade monetária ministrou palestra sobre “Melhoria do Ambiente de Negócios brasileiro: Evolução, desafios e proposições legislativas prioritárias na perspectiva do Bacen”, promovido pela Frente Parlamentar pelo Livre Mercado, no Senado Federal, em Brasília.

“Ao contrário do Brasil, na Argentina, o Banco Central pode financiar o governo, e isso é sempre muito perigoso. Principalmente, agora que ele não tem independência, porque ele é usado como instrumento”, comentou. “Isso gerou uma perda de credibilidade na parte monetária, e depois você também teve uma perda de credibilidade na parte fiscal – aí começa a desorganizar o cenário macroeconômico. Foi isso que aconteceu na Argentina” explicou. Segundo ele, os mercados não acreditavam nas metas argentinas – tanto monetária quanto fiscal.

“Houve uma erosão das bases fiscais muito grandes, porque se tentava fazer uma arrecadação com uma base que era cada vez mais decrescente e em algum momento isso se voltou contra a exportação. É um processo longo de perda de credibilidade.”

O mandatário do BC disse, ainda, que é preciso ‘entender melhor’ o que significa a proposta do presidente eleito da Argentina, Javier Milei, de acabar com o Banco Central e dolarizar a economia. Na última segunda-feira, Milei reafirmou, ainda, que entre 18 e 24 meses vai conter a inflação de seu país, na casa dos 140% anuais – duas das principais e mais polêmicas propostas de sua campanha.

“Fechar o Banco Central é uma obrigação moral, e dolarizar (a economia) é uma maneira de nos livrarmos do Banco Central”, declarou. Milei, no entanto, propôs que a moeda adotada por seu governo “seja aquela escolhida pelos indivíduos”.

Campos Neto entende que, com a dolarização da moeda argentina, uma das funções do Banco Central deixa de existir – apenas uma.

“É óbvio que se você tem uma dolarização tem uma função do Banco Central que deixa de existir, mas o Banco Central tem um mandato de estabilidade da moeda e de estabilidade financeira, isso significa que o BC faz funções de conduta, supervisão e regulação – isso é uma função que alguém tem que fazer, porque não existe uma função financeira sem que tenha supervisão e regulação de conduta. Tem uma parte de controle de fluxos internacionais, controle de entradas e saídas, é independente da moeda, que é gerido pelo Banco Central também.”

A autoridade monetária brasileira lembrou, ainda, que embora a Europa tenha uma moeda única, continua tendo um Banco Central autônomo, assim como vários dos seus países integrantes – além do Reino Unido.

“Então, eu não consigo ver como eliminar todas essas funções. Eu acho bem perto do impossível. Agora, existe uma exceção, porque na Argentina, o Banco Central foi em parte responsável pela degradação da moeda no sentido de ser usado como instrumento para financiar o governo de forma obscura durante muito tempo. No caso do Brasil, isso não é permitido. E no Brasil, o Banco Central tem uma autonomia. Então, eu acho que o mais importante não é acabar com o Banco Central e sim ter um Banco Central que funciona. Esse é o ponto.”, concluiu o presidente.