Bolsa fecha em queda por aversão ao risco fiscal; dólar sobe para R$ 4,8

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São Paulo – A Bolsa encerrou o pregão em queda em movimento contrário ao dos mercados globais, com analistas indicando cautela dos investidores por questões políticas internas, que elevam o risco fiscal e levam os investidores a buscar outros mercados emergentes.

O temor de risco fiscal aumenta com notícias de um possível estouro do teto de gastos pelo governo do presidente Jair Bolsonaro, que negocia um ressarcimento aos Estados para avançar o projeto que limita o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) sobre energia elétrica e combustíveis a 17%.

Outra notícia que impactou o mercado nesta segunda-feira foi a apresentação de um esboço do plano de governo da chapa formada por Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e Geraldo Alckmin (PSB), coordenado pelo ex-ministro Aloizio Mercadante, que propõe a revogação da reforma trabalhista e do teto de gastos e que vê as estatais como indutoras do desenvolvimento econômico do país.

O impulso com a reabertura do mercado chinês após bloqueios para reduzir as contaminações por covid-19 impulsionou as ações da Vale (+0,21%), mas os poucos ganhos não conseguiram levantar a bolsa que registrou queda generalizada, com apenas 24 dos 93 ativos registrando leve avanço, além de baixo volume financeiro, enquanto papéis de peso, como Hapvida e B3 registravam fortes quedas, junto com Petrobras, Bradesco, Itaú Unibanco, Banco do Brasil, Ambev e JBS.

O Ibovespa, principal índice da B3, encerrou a sessão em queda de 0,82%, aos 110.185,91 pontos. O Ibovespa futuro fechou em baixa de 0,93%, aos 110.690 pontos. O volume financeiro do mercado foi de aproximadamente R$ 12,9 bilhões. Em Nova York, as bolsas fecharam em leve alta.

Para a analista Milena Araujo, especialista em renda variável da Nexgen Capital, a queda de hoje é explicada pela baixa das ações da Petrobras e alta insuficiente da Vale para segurar a Bolsa. Ela corrobora a tese de risco fiscal. “A discussão do governo sobre os combustíveis é visto como um risco fiscal e acaba reduzindo a apetite a risco dos investidores”, comentou.

Na visão de Pedro Serra, chefe de pesquisas da Ativa Investimentos, o movimento de hoje indica saída de capital do Brasil para outros países emergentes. “Na minha visão, vejo um fluxo saindo de Brasil indo para outros emergentes. O Brasil recebeu esse fluxo nos últimos dias, muito em função das confusões que tinham lá fora e hoje teve um pouco dessa reversão. Aqui, a pequisa Focus venho em linha com o que o mercado esperava, nada surpreendente. Talvez a questão do Lula sobre o teto de gastos pode ter afetado de alguma forma, mas também não é exatamente uma novidade”, comentou.

Sem observar nenhum gatilho específico, o analista destaca que os papéis ligados ao consumo doméstico foram mais penalizados no pregão desta segunda-feira, provavelmente devido a maiores preocupações com a inflação e com um cenário de ciclo de juros ainda em movimento. “A gente vê os mercados se ajustando até onde vão os juros pelo Banco Central, por quanto tempo ele vai manter os juros mais altos e esses movimentos estressam e dificultam a precificação e isso pode ser a explicação para a cautela do investidor hoje. Mas não é nada muito específico, parece ser um movimento de realização, dado os dias mais positivos recentemente da Bolsa”, arrematou.

Para Leandro Petrokas, diretor de research e sócio da Quantzed, empresa de tecnologia e educação para investidores, o grande destaque no dia fica por conta do baixíssimo volume. “O volume do Ibovespa médio nos últimos 20 dias fica em torno de R$ 20 bilhões e hoje negociou até agora R$ 9,5 bilhões. Temos uma notícia relevante em relação a um documento divulgado em que a chapa Lula-Alckmin prevê revogação da reforma trabalhista e uso de estatais para alavancar desenvolvimento. Pode ser que isso tenha feito preço no nosso mercado descolando do desempenho das bolsas internacionais que trabalham no campo positivo.”

O analista também destaca o movimento das ações da Eletrobras, que chegou a ter um risco de eventual suspensão do processo de privatização por conta da suspensão da assembleia de debenturistas de sua subsidiária Furnas, que era crucial para dar continuidade ao processo. “No meio do dia, a Eletrobras chegou a ter sua negociação suspensa para aguardar essa resolução sobre a questão de Furnas e ainda assim ações (ELET3) voltaram a negociar em alta e ELET 6 praticamente estável. Mercado temia eventual suspensão do processo de privatização. Mas não vimos nenhum reflexo desse fato nos preços das ações.”

Em relação à Positivo, o analista acredita que a queda de hoje deve ter relação com a forte elevação de cerca de 15%, na quinta-feira da semana passada, e hoje, caindo 6,7% devolvendo boa parte do movimento de alta da semana passada com aumento de volume, mas nenhuma notícia relevante sobre o papel. “Então, provavelmente temos um movimento de realização de lucros de quem comprou o papel na baixa e vendeu”, avalia.

O dólar comercial fechou em alta de 0,37%, cotado a R$ 4,7960. Apesar do ambiente externo favorável com a reabertura da China, os riscos fiscais domésticos voltaram ao radar e não deixaram a moeda brasileira ganhar força.

Segundo a economista-chefe da Veedha Investimentos, Camila Abdelmalack, “o risco fiscal voltou a arranhar os ativos domésticos. Mesmo com o (ministro da Economia) Paulo Guedes garantindo que o estado de calamidade não será declarado, o clima ficou um pouco estranho, já que a aprovação de uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) dos Combustíveis é muito difícil, ainda mais em um ano eleitoral”.

Abdelmalack salientou que embora o cenário global seja favorável, o quadro pode mudar ao longo da semana: “Sairão dados importantes de inflação no mundo e no Brasil”, diz referindo-se ao Indice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), que será divulgado na próxima quinta, às 9h.

Para a estrategista de câmbio e economista do Banco Ourinvest, Cristiane Quartaroli, “o principal fator é a China, que é nosso principal parceiro comercial. Mas a volatilidade ainda continua, tudo ainda é muito incerto”.

Quartaroli entende que a alta dos juros nos Estados Unidos, por ora, já foi precificada, mas alerta: “Houve uma melhora com a privatização da Eletrobras que está quase certa, com aumento do fluxo, mas passado isso a aproximação das eleições tende a exercer mais pressão sobre o câmbio”, analisa.

De acordo com boletim da Ajax Capital, “lá fora, fluxo de notícias mais positivas na China impactam positivamente os ativos de risco. Espera-se uma abertura mais positiva para bolsa, de queda do dólar”.

“Pequim continua a flexibilizar as medidas de restrição ao covid, retomando transportes públicos na maioria dos distritos e reabrindo áreas de negócios, com capacidade máxima limitada a 75%. A partir da semana que vem serão reabertas escolas e aulas presenciais”, explica a Ajax.

As taxas dos contratos futuros de Depósitos Interfinanceiros (DI) fecharam em alta neste início de semana após o mercado elevar projeção de inflação para a inflação neste ano.

O DI para janeiro de 2023 tinha taxa de 13,445% de 13,425% % no ajuste anterior; o DI para janeiro de 2024 projetava taxa de 13,110%, de 13,025%, o DI para janeiro de 2025 ia a 12,475%, de 12,435% antes, e o DI para janeiro de 2027 com taxa de 12,395% de 12,310%, na mesma comparação. No mercado de câmbio, o dólar operava em alta, cotado a R$ 4,7950 para venda.

Os principais índices do mercado de ações dos Estados Unidos fecharam em alta, com Wall Street se recuperando da última semana de perdas, apesar do ganho limitado após a alta nos juros norte-americanos derrubaram o pico de alta iniciado pela manhã.

Confira abaixo a variação e a pontuação dos índices de ações dos Estados Unidos após o fechamento:

Dow Jones: +0,05%, 32.915,78 pontos;
Nasdaq Composto: +0,41%, 12.061,4 pontos;
S&P 500: +0,31%, 4.121,43 pontos.