AGU conclui parecer sobre exploração na foz do Amazonas e contraria avaliação do Ibama

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Foto: André Motta de Souza / Agência Petrobras

São Paulo – A Advocacia-Geral da União (AGU) publicou parecer no qual conclui que a Avaliação Ambiental de Área Sedimentar (AAAS) não é indispensável e tampouco pode obstar a realização de licenciamento ambiental de empreendimentos de exploração e produção de petróleo e gás natural no país. A manifestação ocorreu em resposta a solicitação realizada em julho deste ano pelo ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, relativa ao processo de licenciamento para a perfuração do bloco FZA-M-59, localizado na chamada Margem Equatorial, a 175 quilômetros da foz do Rio Amazonas, no norte do país.

O bloco foi leiloado em 2013 pela Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), na 11a Rodada de Licitações aberta para concessão do direito de exploração e produção desses insumos.

De acordo com o Ministério de Minas e Energia (MME), em maio deste ano o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) indeferiu licença para a perfuração do poço no bloco. Segundo a pasta, os principais argumentos listados pelo órgão para a rejeição do pedido foram: a) necessidade de realização de estudos de caráter estratégico (AAAS) na bacia da foz do Amazonas; b) eventuais impactos sobre comunidades indígenas devido ao sobrevoo de aeronaves entre o Aeródromo do Oiapoque/AP e o local do Bloco FZA-M-59; e c) tempo de resposta e atendimento a fauna atingida por óleo, em caso de vazamento.

Diante da negativa, e por discordar da compreensão dada pelo órgão ambiental a dispositivos normativos aplicáveis ao caso, o MME solicitou à AGU que realizasse a interpretação de tais normas em caráter de urgência diante da relevância da discussão para os investimentos nesse importante projeto, inclusive no que toca aos aspectos econômicos, sociais e ambientais.

A análise foi realizada pela AGU, por meio da Consultoria-Geral da União (CGU), com base no artigo 4o, inciso X, da Lei Complementar nº 73/93. O dispositivo estabelece como atribuição da Advocacia-Geral da União fixar a interpretação da Constituição, das leis, dos tratados e demais atos normativos, a ser uniformemente seguida pelos órgãos e entidades da Administração Federal.

Precedentes do STF

O entendimento estabelecido por meio do parecer da AGU é reconhecido em manifestações de áreas jurídicas de órgãos federais ligados ao assunto, e também foi encampado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em julgamentos recentes. Na apreciação das Arguições de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPFs nº 825 e nº 887), a Corte decidiu que a viabilidade ambiental de um empreendimento deve ser atestada no próprio licenciamento, e não por meio de AAAS.

Nos precedentes mencionados, o STF expressa a compreensão de que é no procedimento de licenciamento ambiental que são aferidos de forma específica, aprofundada e minuciosa, a partir da Lei nº 6.938/1991, os impactos e riscos ambientais da atividade a ser desenvolvida.

Para a AGU, a legislação vigente, incluindo a Portaria Interministerial MME MMA n.º 198, de 5 de abril de 2012, é clara ao fazer a distinção entre AAAS e licenciamento ambiental. O primeiro é instrumento que confere subsídios informativos e de caráter geral ao processo de planejamento estratégico no rito de outorga de blocos exploratórios de petróleo e gás natural. Trata-se de uma avaliação prévia à licitação de concessão dos blocos sobre a aptidão de determinada região com potencial de exploração de petróleo e gás. O licenciamento ambiental, por sua vez, é um procedimento da política nacional de meio ambiente, utilizado para avaliar a viabilidade de projetos específicos, a partir de identificação de impactos potenciais associados aos projetos.

No documento, a AGU recorda que, também de acordo com o artigo 27 da Portaria Interministerial MME MMA n.º 198/2012, a AAAS pode até mesmo ser substituída por manifestação conjunta das duas pastas. Esse aspecto também foi analisado no parecer em razão de um questionamento realizado por órgãos ambientais sobre a necessidade de reedição dessa manifestação conjunta a cada cinco anos.

Para a AGU, a única interpretação aceitável desse dispositivo é que a validade de cinco anos para a manifestação conjunta vale apenas para as áreas que ainda não foram outorgadas, nem submetidas à AAAS, até que o processo se estenda a todas as áreas sedimentares do país. Ou seja, como a área do Bloco FZA-M-59 foi outorgada, não há, segundo a AGU, necessidade de reedição da manifestação: O IBAMA sempre entendeu ser desnecessária a renovação da manifestação conjunta para os blocos que foram arrematados. (…) não fazendo sentido à época – como não faz sentido fazê-lo hoje -, exigir nova Manifestação Conjunta para bloco já outorgado, assinala a instituição no parecer.

Conciliação

Além de fixar a interpretação relativa à dispensabilidade do AAAS para o licenciamento ambiental, a AGU também encaminhou à Câmara de Mediação e de Conciliação da Administração Pública Federal (CCAF) solicitação de abertura de processo administrativo de conciliação entre os órgãos federais envolvidos no assunto. O objetivo da medida é buscar a resolução consensual dos demais pontos divergentes relativos ao caso, incluindo os levantados pelo Ibama na negativa do licenciamento sobre os impactos de sobrevoos para as comunidades indígenas e o plano de proteção à fauna.

Unidade da CGU/AGU, a CCAF é responsável por realizar processos de solução consensual de conflitos que envolvem órgãos da administração pública direta, autarquias ou fundações federais, e entre esses órgãos e os particulares, incluindo empresas privadas e públicas.

Com o envio à CCAF do caso relativo à Margem Equatorial, os gestores da Câmara seguirão o rito definido para as conciliações que ocorrem no âmbito da unidade. Deverão, portanto, convidar, nos próximos dias, consultores jurídicos e representantes da alta gestão dos ministérios de Minas e Energia e do Meio Ambiente e Mudança do Clima, além dos demais órgãos públicos e empresas públicas ou privadas envolvidas com o assunto, para conversas unilaterais com o objetivo de observar a viabilidade da proposta negocial, a voluntariedade das partes, e também realizar as primeiras análises de risco relativas ao caso.

Concluída essa etapa inicial, e verificada a viabilidade da conciliação, a CCAF realiza a admissibilidade, emitindo parecer pela instauração do procedimento administrativo de resolução consensual de conflito. O rito do procedimento tem previsão no art. 32 da Lei nº 13.140/2015, norma que regulamenta a mediação como meio de solução de controvérsias no âmbito da administração pública, e também em normativos internos da AGU.

A solução consensual eventualmente produzida na CCAF no caso pode ser, ao final, formalizada em Termo de Conciliação, que, após os processos de validação, passa a ter natureza de título executivo extrajudicial.

Para fazer a análise das normas incidentes sobre o objeto do parecer, a AGU solicitou manifestações sobre o caso às áreas jurídicas de todos os órgãos envolvidos com o tema, entre os quais o MMA e MME. Do mesmo modo, realizou reuniões com representantes desses órgãos com o propósito de ouvir opiniões e esclarecer aspectos relativos ao assunto. O parecer ficou a cargo da Coordenação-Geral de Políticas Públicas (DECOR/CGU/AGU).