PERSPECTIVA: Crise no setor bancário e o papel dos bancos centrais na sua resolução

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Silicon Valley Bank (SVB)

A crise no setor bancário parece ter se arrefecido, com a solvência de bancos que apresentaram problemas de liquidez. O clima parece de estabilidade, e a expectativa é saber qual vai ser a posição dos bancos centrais sobre a política monetária.

Para o economista e analista do Éfi Bank, Paulo Silva, o problema, na verdade, teve início a partir das imensas injeções de recursos que o Federal Reserve (Fed, o banco central americano) implementou na economia norte-americana, que beneficiou os bancos regionais e médios com uma taxa de juros baixa.

O problema começou justamente na gestão desse dinheiro. Acredito que a crise no SVB decorreu mais uma falha de gestão de portifólio, uma falha de governança, do que necessariamente algo mais sistêmico, afirma Silva.

A falência do SVB, comprado pelo First Citizens, além do resgate do Signature Bank pelo Fed e do aporte de grandes bancos ao First Republic Bank, gerou temores de que a crise poderia ser sistêmica, o que, para o economista do Efí Bank ainda não é o caso.

Acredito que seja algo bem pontual e que no curto prazo não se alastre. O Fed agiu rápido para evitar problemas maiores, mas ainda me chama atenção como eles irão lidar com a atual taxa de juros, explica Silva.

O papel do Fed

O Fed teve papel importante na crise bancária recente, mas deve manter a postura rígida da política monetária, afirmam analistas consultados pela Agência CMA. De acordo com o especialista da Valor Investimento, Charo Alves, o ciclo de apertos que o Comitê Federal de Mercado Aberto (Fomc, na sigla em inglês) decidiu colocar em prática há mais de um ano resultou em uma queda livre no sentimento de risco no mercado.

“Com isso, os que mais sofrem são os bancos menores, fintechs e startups. Elas não possuem um retorno de lucro elevado, dependem quase que exclusivamente de investimento. Assim, quando o dinheiro passa a ser mais difícil de se conseguir, a fonte seca e eles quebram”, afirma ele.

“Dados divulgados em março mostraram que os empréstimos concedidos pelo Fed aos bancos subiram para US$ 354 bilhões. Isso é superior aos US$ 15 bilhões antes da falência do Silicon Valley Bank. Também é historicamente alto, comparando com um pico de US$ 440 bilhões observado durante a Grande Crise Financeira de 2008”, diz o chefe regional de pesquisas do ING, Padhraic Garvey.

O que o Fed acredita é que esse estresse bancário pode causar menos acesso ao crédito e fortalecer sua política monetária mais restritiva, ajudando com a queda inflacionária. “Apesar do Fed se ver entre a manutenção desses bancos menores e as medidas contra inflação, é mais provável que eles se fixem na estabilidade de preços”, diz Alves.

O caso Credit Suisse e o BCE

Após a quebra dos bancos regionais nos Estados Unidos, o europeu Credit Suisse se tornou o centro das incertezas. As ações do gigante suíço desabaram 24% no último dia 15, depois que o banco afirmou ter encontrado “fraquezas” em seus relatórios financeiros.

Os temores de uma crise bancária mais ampla provocaram fortes quedas nas bolsas de valores de todo o mundo, fazendo com que autoridades monetárias dos Estados Unidos e da Suíça agissem rapidamente para que o problema localizado das instituições não se tornasse uma crise geral.

É quase que um efeito em cascata, pois quando um banco vai a falência ou precisa de ajuda, mais instituições acabam entrando na mesma situação, criando um clima desconfortável de que algo está errado e, na maioria das vezes, está. O grande ponto é se esse risco é contornável entre os bancos ou se precisarão da ajuda dos governos, observa Idean Alves, sócio e chefe da mesa de operações da Ação Brasil Investimentos.

Na Europa, a situação é agravada pelo cenário de taxas de juros mais alta em meio à disparada da inflação. Alves destaca que a Europa está longe de viver seus tempos áureos de União Europeia forte.

Segundo ele, agora vivemos uma tentativa das economias de se fecharem mais e preservarem os seus mercados consumidores. Não é o cenário-base, mas se tivermos uma crise parecida com a última de 2012, a Europa não terá a mesma facilidade para resolver, afirma.

Apesar disso, a avaliação é de que o Banco Central Europeu (BCE) continuará com seu ciclo de aperto monetário para retornar a inflação à meta de 2%. O BCE deve manter a mesma linha nas próximas reuniões, pois o discurso da política monetária global se tornou uníssono: o aperto monetário vai continuar enquanto a inflação continuar elevada de acordo com a média histórica de cada país, o que não significa necessariamente novos aumentos drásticos, mas sim que a taxa atual deve continuar por mais tempo, e de que eles não hesitarão em subir juros se isso for realmente necessário, diz o especialista.

Reportagem de Darlan de Azevedo, Júlio Viana e Larissa Bernardes
Edição: Vanessa Zampronho / Agência CMA