Pausa na Selic ganha fôlego, mas alta em 2021 segue no foco

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Roberto Campos Neto, Presidente do Banco Central do Brasil, apresenta o Balanço da Agenda BC#. (Foto: Raphael Ribeiro/ BCB)

São Paulo, 8 de dezembro de 2020 – O noticiário que antecede a última reunião deste ano do Comitê de Política Monetária (Copom) favorece a manutenção da taxa básica de juros em 2%, pela terceira vez seguida. O compromisso do governo com as contas públicas, ao menos até fevereiro, a antecipação do reajuste na conta de luz para dezembro e o ritmo aquém do esperado da retomada econômica no terceiro trimestre afastam a chance de uma alta iminente da Selic em 2021, mas isso não significa que os riscos fiscais e inflacionários foram dissipados.

O economista-chefe do Banco Fator, José Francisco de Lima Gonçalves, explica que é preciso levar em conta que a economia, brasileira e global, ainda está longe do nível pré-pandemia, o que prescreve um alto grau de estímulo, monetário e fiscal, tanto no Brasil quanto nos Estados Unidos, principalmente. “Mas enquanto Janet Yellen, no Tesouro dos EUA, e Jerome Powell, no Federal Reserve, podem promover no governo Biden uma recuperação da atividade; aqui, os componentes de demanda devem perder ritmo”, diz.

Ele se refere à perspectiva de fim da transferência de renda do auxílio emergencial, o que pode derrubar o consumo das famílias, em meio à queda da renda, e também à ausência de investimento privado (Formação Bruta de Capital Fixo), que não tem compensado a falta de investimentos públicos. “No frigir dos ovos, o sinal de que o Orçamento voltará ao ‘teto’ e que a dívida continuará crescendo inibe que os juros muito baixos ajudem na recuperação [econômica]”, esclarece o economista do Fator.

Por isso, de todos os fatores, o que mais preocupa continua sendo a ameaça fiscal. “O presidente [Jair] Bolsonaro ainda não desistiu do novo programa social. Só adiou a ideia”, afirma o operador da Renascença Corretora Luís Felipe Laudísio, referindo-se à decisão do governo de não prorrogar o benefício social para além de dezembro. Porém, uma eventual inclusão da população vulnerável que ficará desassistida pode ocorrer quando for discutido o Orçamento para 2021, provavelmente na volta do recesso parlamentar.

Somados à incerteza na política fiscal, estão os parâmetros propostos na agenda de reformas (tributária e administrativa). O economista da Guide Investimentos, Victor Beyruti, avalia que uma vez esgotados os efeitos transitórios do auxílio emergencial, é fundamental aumentar a capacidade produtiva via mudanças estruturais. “É por essa razão que os desafios crescem e o foco se concentra em termos de crescimento potencial”, explica.

JOGO PERIGOSO

Já do lado da inflação, houve um alívio. A retomada do sistema de bandeira tarifária na conta de luz, que havia sido suspenso em maio por causa da pandemia, antecipa uma alta nos preços que só era esperada para 2021. Cálculos de economistas apontam que a vigência da bandeira vermelha no patamar dois neste mês resulta em um impacto de 0,45 ponto percentual (pp) na inflação oficial (IPCA) de 2020, mas em um alívio de 0,30 pp no IPCA do ano que vem.

Divulgado nesta manhã, o IPCA acumula alta de 4,3% em 12 meses até novembro, já acima do centro da meta para o ano, de 4%. Para um diretor da tesouraria de um banco estrangeiro, seja na inflação ou no fiscal, o governo está “jogando com o calendário” para manter a Selic baixa, após uma “flexibilização totalmente desnecessária e agressiva”. Segundo ele, a equipe econômica tem usado as taxas de câmbio e de juros para fazer o ajuste  fiscal, reduzindo o custo da dívida pública, ao invés de promover as reformas.

“A experiência de promover tal estratégia em meio a uma forte pressão de alta nos preços e à deterioração fiscal nunca é boa, pois não se pode controlar tudo ao mesmo tempo”, ressalta o diretor. Por isso, ele avalia que o Banco Central terá de resolver em breve o acúmulo de riscos fiscais e inflacionários, elevando a Selic. Cálculos de profissionais das mesas de operação indicam que a primeira alta no juro básico ocorreria em março, com quase 100% de chance de aumento residual, de 0,25 ponto percentual (pp).

Edição: Eduardo Puccioni (e.puccioni@cma.com.br)