Eleição de Lula não deve mudar política macroeconômica mas pode afetar bancos, diz Fitch

698
Foto: www.solvencyiiwire.com

São Paulo – Parece improvável que a reeleição do candidato de esquerda Luiz Inácio Lula da Silva a presidente do Brasil resulte em grandes mudanças na política macroeconômica, embora sejam previstas algumas alterações nas políticas microeconômicas, o que pode afetar os bancos brasileiros, disse a agência de classificação de risco Fitch Ratings, que continuará avaliando a capacidade e a propensão do governo prestar suporte aos bancos estatais.

Lula assumirá a presidência em 1 de janeiro de 2023, mas o fato de que ainda não definiu sua equipe econômica resulta em alguma incerteza em relação à previsibilidade das políticas a serem adotadas, escrevem os diretores Claudio Gallina e Raphael Nascimento, da Fitch.

De acordo com a agência, o ambiente operacional é o principal fator de ancoragem dos ratings de todos os bancos, cujos ratings são baseados na qualidade de crédito intrínseca, refletida em seu Rating de Viabilidade (RV). O rating soberano (BB-) influencia o score do Ambiente Operacional, mas também pode ser ajustado por fatores relevantes para o Brasil, tais como: porte da instituição, estrutura, estabilidade e desempenho da economia, patamar e crescimento do crédito, desenvolvimento do mercado financeiro, regulamentação e estrutura legal, bem como expectativas para os indicadores gerais de crédito.

“No entanto, os bancos estatais serão monitorados atentamente, pois estas entidades provavelmente enfrentarão o impacto mais imediato da mudança de governo. Os ratings de bancos federais são baseados em suporte e, portanto, estão vinculados à qualidade de crédito do soberano”, explica a Fitch.

Um dos principais pontos a serem monitorados será a evolução dos perfis financeiros dos bancos estatais. A participação dos bancos privados nos empréstimos domésticos aumentou para 57,6% no segundo semestre de 2022, de 53,2% em junho de 2020, enquanto a participação de mercado dos bancos federais caiu para 42%, de 46% no mesmo período.

Na avaliação da Fitch, os governos de esquerda podem estimular ainda mais os bancos públicos a desenvolverem um apetite por crédito mais forte do que os de bancos privados em determinados períodos, embora ainda seja muito cedo para afirmar que isto acontecerá.

Uma possível mudança no cenário competitivo pode afetar os bancos privados, especialmente as instituições de menor porte, que podem sofrer com a redução da participação de mercado e um possível aumento dos custos de captação.

“Os bancos públicos possuem estratégias específicas e, assim como os bancos privados, seguem as políticas e orientações provenientes do controlador. Historicamente, tais diretrizes estratégicas têm sido revisadas em função de mudanças de governo. A Lei das Estatais (de 2016) e a independência do Banco Central (conquistada durante o mandato do atual presidente) podem, até certo ponto, limitar as mudanças em termos de administração (e, consequentemente, mudanças nas estratégias) dos bancos públicos.”

A independência do Banco Central será testada no novo governo, segundo o seu atual presidente, Roberto Campos Neto, e indica que o ambiente regulatório pode sofrer menos influência para flexibilizar/dispensar diretrizes regulatórias, em função de uma possível mudança no governo.

“A Fitch monitorará atentamente o risco de mudanças nas estratégias recentemente fortalecidas dos bancos estatais, que possam afetar negativamente os indicadores financeiros destes bancos, principalmente a qualidade de ativos, a lucratividade e a capitalização”, comenta.

A Fitch avalia que a atual estratégia de reposicionamento do governo para alguns bancos estatais, que reduziram sua capacidade de concessão de crédito, devido ao acordo de pré-pagamento de instrumentos híbridos ao seu controlador (o governo), impulsionou a queda da participação dos bancos federais no mercado de crédito desde 2016, quando o partido de esquerda terminou seu mandato.

Na visão da Fitch, aumentos súbitos e significativos no volume de operações de crédito geralmente são seguidos por um incremento nos problemas relacionados ao crédito. A elevada inflação e o aumento do endividamento familiar são as principais fontes de pressões sobre a qualidade dos ativos até o momento. Em termos de perdas e lucros (P&L), a gestão de custos também será fundamental.

Na opinião da Fitch, embora os atuais patamares de cobertura das reservas ofereçam proteção suficiente para o esperado aumento das perdas de crédito, e as políticas de crédito dos bancos públicos tenham sido gradualmente fortalecidas algo que ficou mais claro após a Operação Lava Jato em 2014 os riscos de interferência do governo nas operações destes bancos permanecem.

No entanto, os atuais patamares de inadimplência dos bancos públicos (principalmente do BNDES, da Caixa e do Banco do Brasil) indicam que boas práticas têm sido seguidas nos últimos anos.