Dominguetti confirma denúncia de pedido de propina na Saúde à CPI

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Luiz Paulo Dominguetti Pereira, representante da Davati, em depoimento à CPI da Pandemia. (Foto: Edilson Rodrigues / Agência Senado)

São Paulo – O representante comercial Luiz Roberto Dominguetti confirmou à Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) do Senado que investiga erros do governo no combate à pandemia de covid-19 que o ex-diretor de logística do Ministério da Saúde, Roberto Dias, pediu propina para a compra de vacinas da AstraZeneca.

Repetindo as afirmações feitas ao jornal Folha de São Paulo, Dominguetti relatou que, durante um encontro com Dias num shopping de Brasília em 25 de fevereiro, apresentou uma proposta comercial para vender 400 milhões de doses de vacinas da AstraZeneca contra a covid-19 para o Ministério da Saúde, a um preço de US$ 3,50 por dose.

Ele disse que Dias ressaltou a necessidade de “melhorar este valor”. Dominguetti então disse ter afirmado que precisaria consultar a Davati, empresa que estava representando, a respeito de potenciais descontos, mas que foi interrompido por dias. “É para cima, é para mais”, teria dito o ex-diretor de logística, segundo Dominguetti, mencionando a necessidade de elevar o preço em US$ 1 por dose.

O acréscimo seria para “fechar com o grupo” do Ministério da Saúde, teria dito Dias. O representante da Davati disse que, em seguida, o ex-diretor recomendou que ele pensasse “direitinho” e apresentasse posteriormente uma proposta ao Ministério da Saúde em uma nova reunião, que segundo Dominguetti aconteceu no dia seguinte.

Nesta reunião, que aconteceu com o então secretário-executivo do Ministério da Saúde Elcio Franco, Dominguetti disse ter apresentado novamente a proposta de venda de 400 milhões de doses de vacinas da AstraZeneca por US$ 3,50 a dose – ou seja, sem o acréscimo exigido por Dias.

Franco, porém, teria demonstrado desconhecimento a respeito da proposta apresentada por Dominguetti.

“Essa negociação não avançou. Quando estive com Elcio Franco, a proposta foi de 400 milhões de doses, e Elcio Franco disse não ter conhecimento. Perguntou com quem tinha deixado essa proposta. Eu disse Roberto Dias. Houve troca de olhares, ele baixou a cabeça, simplesmente saiu, pediu que dois estagiários pegassem nossos nomes que entrariam em contato, que ia validar a proposta da Davati.”

Dominguetti não soube explicar exatamente como a Davati teria acesso às vacinas produzidas pela AstraZeneca, que segundo a empresa não são vendidas por meio do mercado privado nem via intermediários no Brasil. Dominguetti disse à CPI que a Davati assegurou a ele ter acesso a “alocadores” das vacinas, mas não soube detalhar os trâmites.

“A informação que tínhamos era que o dono da Davasti tinha acesso a alocadores no mercado que eram proprietários desta vacina”, afirmou.

Ele ressaltou, porém, que não teria como alterar o preço ainda que a Davati aceitasse cometer irregularidades porque não seria possível convencer os fornecedores a alterarem os preços. “Se lá não sai a esse valor, como é que eu ia colocar um dólar aqui? Onde eu ia arrumar essa nota: O mercado lá fora é que dita”, afirmou.

LUIS MIRANDA

Dominguetti também disse ao longo da reunião que o deputado Luis Miranda (DEM-DF) procurou a empresa para tentar intermediar a compra de vacinas contra a covid-19 para um comprador, e apresentou um áudio em que Miranda comentaria sobre o assunto. O evento causou comoção entre os senadores, com parte deles alegando que a informação estava sendo plantada pelo governo.

O representante disse inicialmente à CPI que recebeu em 24 de junho um áudio de seu superior na Davati, Cristiano Carvalho, que seria de Luis Miranda tratando sobre a compra de vacinas para um terceiro. Assim diz a gravação:

“O grande problema é: vou falar direto com o cara, o cara vai pedir toda a documentação do comprador. O comprador meu já está de saco cheio disso, vai pedir a prova de vida antes e a gente não vai fazer negócio. Então a gente nem perde tempo. Você sabe que eu tenho um comprador e com potencial de pagamento instantâneo, tanto é que ele compra o tempo todo lá, quantidades menores obviamente.”

“Se o seu produto estiver no chão, captar um vídeo, falar no meu nome. ‘Luis Miranda, tem aqui o produto e tal’. O meu comprador entende que é fato, ok, e encaminha toda a documentação necessária, amarra, faz as travas, faz os contratos todos e bola para frente. Não vou mais perder tempo com este comprador porque desgastou muito o meu nome nos últimos 60 dias, muita conversa fiada no mercado, e aí eu não me sinto nem confortável.”

“Encontrei uma carga, vamos dar prosseguimento, vamos mandar toda a documentação de novo. Daqui a pouco vamos chegar na SGS e você vai ver que a carga existe. Eu não vou perder tempo. Cara, faz uma live comigo, facetime, pode fazer, meu irmão, um Skype, o que ele quiser. Me mostra a carga, se você quiser gravar um vídeo, grava um vídeo: ‘Aê, Luis Miranda, I’m here in my warehouse, this is my product’, mostra o produto para mima, e tá tudo certo, bola para frente”

“Eu mando para o cara na hora, o cara fecha negócio, cara, na hora, o cara tem cliente fixo, entendeu. Ele tem recorrência, esse é o grande problema desse meu cliente. Ele tem recorrência, fechou contrato com Walmart, Walgreen’s, com as redes de restaurantes.”

Depois da apresentação do áudio, Dominguetti foi pressionado a dizer novamente se os comentários de Miranda eram referentes a compra de vacinas, e disse não ter certeza.

Depois de apresentado o áudio, o presidente da CPI, Omar Aziz (PSD-AM), disse que telefonou para Luis Miranda, na presença de outros senadores, e questionou o deputado federal a respeito do áudio.

“Fui conversar com o deputado Luis Miranda e fiz questão que tivesse testemunha da minha conversa com ele. Fernando bezerra conversou ele, disse que esse áudio é de 2020, que é negociação nos Estados Unidos, não tem nada a ver com Brasil. É áudio que nem se falava em vacinas ainda, e que está editado aqui para prejudicá-lo. Ele foi agora à polícia levar o áudio completo, fazer uma denúncia crime”, disse Aziz.

Miranda recentemente denunciou irregularidades na compra, pelo Ministério da Saúde, da Covaxin, vacina contra a covid-19 desenvolvida pela Bharat Biotech. Ele foi ouvido pela CPI recentemente e deve ser ouvido novamente na próxima terça-feira, depois de afirmar que teria recebido proposta para ficar calado a respeito das irregularidades em troca de dinheiro.

Assista a íntegra da reunião abaixo: