BC quer criar “super agregador” de apps de bancos para integrar com moeda digital

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O presidente do Banco Central (BC), Roberto Campos Neto, durante cerimônia de transmissão de cargo.

São Paulo – Em entrevista gravada ao canal da BlackRock Brasil no YouTube, transmitida nesta quinta-feira, o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, falou sobre como inovações como o Pix e o OpenFinance impactam diretamente o investidor pessoa física. No futuro, a proposta é criar um “super agregador” para unir os aplicativos dos bancos, com a função de gerar, guardar e categorizar dados de uma forma homogênea e sem assimetrias, para trocá-los por tokens e conversar com a moeda digital que está em desenvolvimento pelo banco central brasileiro.

“O mundo ainda não conseguiu desenvolver uma solução integrada para monetizar os dados. Hoje, os dados estão mais na mão das empresas do que das pessoas. E uma coisa que queremos fazer na área financeira é um super agregador, um app que vai juntar todos os apps de bancos em um só, e a gente gostaria que ele tivesse uma função de gerar e guardar dados e categorizar os dados de uma forma homogênea para trocá-los por tokens, que falariam com a moeda digital que estamos criando”, explicou Campos Neto, ressaltando que os dados gerados devem ser homogêneos para evitar assimetrias, o que demandará uma padronização.

Para o presidente do BC, no negócio de crédito, em grande parte dos produtos em que há um spread elevado, isso ocorre quando há um problema de informação assimétrica. “Se eu tenho menos informação sobre a minha contraparte, eu vou cobrar mais pelo serviço. Se for possível reduzir essa informação assimétrica, é possível baratear os produtos, por que diminui a incerteza entre o provedor e o comprador”, avalia.

Campos Neto disse que durante o governo do presidente Jair Bolsonaro, levou esse conceito ao então ministro da Saúde Marcelo Queiroga como uma forma de reduzir o spread em serviços médicos, que, na sua avaliação, é uma área bastante sensível e com mais dados sobre a saúde do cliente é possível precificar melhor. “Então, é possível dizer que poderemos ter um ‘open tudo’ com a redução das assimetrias utilizando plataformas como o Open Finance em outras áreas, fazendo com que o spread caia e tendo produtos mais ‘sob medida’.”

Segundo o executivo, ao criar a agenda de inovações, o BC tinha o objetivo de atender demandas de inclusão, competição e sustentabilidade. “Sempre que apareciam esses debates, se falava na necessidade de ter um sistema mais inclusivo, precisamos democratizar o acesso à intermediação financeira. E a tecnologia é o instrumento mais democratizante que se tem no mundo, com tecnologia você consegue massificar o acesso, participação e os dados”, comentou.

A primeira visão é que era preciso inserir tecnologia no sistema financeiro e o BC já tinha os planos e depois desenvolveu como implementá-los em blocos. “Era preciso um trilho universal para trafegar produtos, e aí veio o Pix, que surgiu como essa proposta, com aceitação ampla, e que serviria como esse trilho, os pagamentos instantâneos, que poderia gerar competição. E o Open Finance veio em cima do Pix. E, uma vez que você tem um sistema competitivo, universal, com portabilidade e comparabilidade imediata, veio a terceira fase de inovação, de tokenização, que é a moeda digital”, explicou.

A partir das inovações, foram surgindo outras ideias e aprendizados. “É importante mostrar que a inovação será boa para todo mundo. Alguns participantes poderiam ter perda de receita temporária, mas seria superado pela possibilidade de desenvolver novos produtos.”

Ele destacou que foram criadas 9 milhões de contas com o Pix e que o BC se espelhou em modelos de outros países como a India. “Olhamos muito o que o Pix poderia significar, mas o projeto brasileiro tem novas dimensões, batente ambiciosas em relação a invocações de outros países. O Open Finance é bastante mais aberto e mais aderente que alguns outros lugares, tem mais produtos.”

Em relação ao ajuste do Open Finance à moeda digital, Campos Neto disse que a forma como a moeda foi pensada, um depósito tokenizado, era um projeto único no começo e, recentemente, o UBS escreveu um trabalho denominado “commercial bank, digital money”, que pode ser uma saída mais fácil e que tem a mesma proposta do BC mais com nome diferente. “De fato, o Brasil desenvolveu várias iniciativas no caminho correto.”

Gestão de ativos

Campos Neto disse que muitos bancos centrais optaram por comprar ativos no mercado e que o Brasil teve essa opção de comprar crédito dada pela “PEC de guerra”, mas que ele considerou usar apenas em último caso. No seu entendimento, era muito melhor dar liquidez para o sistema bancário comprar os títulos ao invés do BC fazer a compra, já que sistema bancário conhecem mais o mercado.

“A gestão de ativos tem sido muito questionada, muitos bancos centrais optaram por comprar ativos no mercado, com taxa de juros muito baixa e prazo médio muito longo. Quando o preço muda um pouco, a variação financeira é gigantesca. Há bancos centrais que tiveram perdas enormes em seus balanços, uma parte relevante do PIB, por que comprou com taxa muito baixa e depois teve uma elevação muito grande”, explica.

Em relação às reservas, ele disse que o BC fez uma grande mudança em sua governança e tem uma diretriz específica de preservação de capital. “Olhamos muito para diversificação de ativos, para como fazer uma ‘pegada’ de sustentabilidade na gestão das reservas, o que não é fácil, por que não há tantos instrumentos para comprar reservas sustentáveis, há muito ‘greenwashing’ [divulgação falsa de dados de sustentabilidade]. Às vezes, quer diversificar moedas e um determinado país tem uma característica não tão boa e acaba piorando seu critério de sustentabilidade. Então, no final, é preciso montar uma grande matriz, com governabilidade, com um sentido de preservação, por que reserva não é instrumento para se obter lucros, mas preservar capital, mas tentando ter o melhor retorno possível e uma governança mais robusta possível.”

O BC teve um grande programa de gestão terceirizada, mas optou por gerir diretamente os próprios ativos. “Hoje a maior parte da gestão é direta, mas estamos abertos à gestão terceirizada para tentar aprender o máximo sobre o maior número de ativos, dentro dos critérios de preservação de capital, governança e sustentabilidade, principalmente por que estamos olhando novas classes de ativos.”