Roberto Dias nega na CPI acusação de pedido de propina

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O ex-diretor de Logística do Ministério da Saúde, Roberto Ferreira Dias. (Foto: TV Senado)

São Paulo – O ex-diretor de logística do Ministério da Saúde Roberto Dias, acusado de ter cobrado propina para a compra de vacinas contra a covid-19, negou a acusação e confirmou ter sido indicado ao cargo pelo ex-deputado federal Abelardo Lupion (DEM-DF), e não pelo deputado Ricardo Barros (PP-PR), atual líder do governo na Câmara dos Deputados.

Na semana passada, o representante comercial Luiz Roberto Dominguetti disse à Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) do Senado que investiga erros do governo no combate à pandemia de covid-19 que Dias, enquanto era diretor de logística do Ministério da Saúde, pediu propina para a compra de vacinas da AstraZeneca.

Ele relatou que, durante um encontro com Dias num shopping de Brasília em 25 de fevereiro, apresentou uma proposta comercial para vender 400 milhões de doses de vacinas da AstraZeneca contra a covid-19 para o Ministério da Saúde, a um preço de US$ 3,50 por dose.

Ele disse que Dias ressaltou a necessidade de “melhorar este valor”. Dominguetti então disse ter afirmado que precisaria consultar a Davati, empresa que estava representando, a respeito de potenciais descontos, mas que foi interrompido por dias. “É para cima, é para mais”, teria dito o ex-diretor de logística, segundo Dominguetti, mencionando a necessidade de elevar o preço em US$ 1 por dose.

O acréscimo seria para “fechar com o grupo” do Ministério da Saúde, teria dito Dias. O representante da Davati disse que, em seguida, o ex-diretor recomendou que ele pensasse “direitinho” e apresentasse posteriormente uma proposta ao Ministério da Saúde em uma nova reunião, que segundo Dominguetti aconteceu no dia seguinte.

“Nunca pedi nenhum tipo de vantagem ao senhor Dominguetti, nem a ninguém”, disse Dias hoje em depoimento à CPI. Na versão de Dias, em 25 de fevereiro ele “foi tomar um chope com um amigo” no restaurante Vasto, e que “em dado momento se dirigiu à mesa o coronel Blanco, acompanhado de pessoa que se apresentou como Dominguetti”.

Blanco foi funcionário do Ministério da Saúde até o início deste ano e, segundo Dias, fora nomeado pelo ex-ministro Eduardo Pazuello. Este é o primeiro ponto em que as versões de dias e Dominguetti divergem – segundo o representante comercial, Blanco estava à mesa com Dias. Dias não disse como Blanco sabia que ele estaria do restaurante.

O ex-diretor de logística prosseguiu: “feitas as apresentações Dominguetti disse representar empresa que possuía 400 milhões de doses de vacina da fabricante AstraZeneca. Neste momento, eu disse que isso já havia circulado no ministério, mas nunca teria sido apresentada documentação necessária”.

A documentação, segundo ele, seria um comprovante de que a empresa representa a fabricante da vacina – no caso, a AstraZeneca. Dias disse que Cristiano Carvalho, representante da Davati no Brasil e superior hierárquico de Dominguetti, já havia falado sobre o tema com outras autoridades do Ministério da Saúde.

Dias afirmou que Dominguetti disse ser parceiro de Cristiano Carvalho, e que a Davati teria os documentos exigidos. “Foi pedido que encaminhasse pedido formal de agenda ao ministério, que em agenda oficial, se sua documentação fosse consistente, processo seria aberto e encaminhado à secretaria-executiva apara providências, uma vez que a ela cabia toda a negociação de vacinas covid-19”, acrescentou.

REUNIÃO

No dia 26 de fevereiro, Dominguetti foi ao Ministério da Saúde para a reunião. Dias disse que o encontro foi ajeitado em prazo curto porque Dominguetti havia dito que estava com viagem marcada para sair de Brasília (DF).

De acordo com a versão de Dominguetti, ele conversou com o então secretário-executivo do Ministério da Saúde Elcio Franco, e disse ter apresentado novamente a proposta de venda de 400 milhões de doses de vacinas da AstraZeneca por US$ 3,50 a dose – ou seja, sem o acréscimo que teria sido exigido por Dias. Franco, porém, teria demonstrado desconhecimento a respeito da proposta apresentada por Dominguetti.

“Essa negociação não avançou. Quando estive com Elcio Franco, a proposta foi de 400 milhões de doses, e Elcio Franco disse não ter conhecimento. Perguntou com quem tinha deixado essa proposta. Eu disse Roberto Dias. Houve troca de olhares, ele baixou a cabeça, simplesmente saiu, pediu que dois estagiários pegassem nossos nomes que entrariam em contato, que ia validar a proposta da Davati.”

Dias disse que Dominguetti foi atendido por ele, na presença de outra servidora do Ministério da Saúde, e que os documentos apresentados pelo representante da Davati “se mostraram mais do mesmo”.

“Não havia carta de representação do fabricante. Entretanto, o mesmo alegou que a receberia em instantes. Eu disse então que possuía outra agenda, mas que se ele quisesse aguardar, ficasse à vontade na sala ao lado. Tempos depois se despediu, disse que teria que ir embora e nunca mais tive notícias”, disse Dias.

Ele afirmou que Dominguetti é um “picareta que tentava aplicar golpes em prefeituras e no Ministério da Saúde, e durante sua audiência deu mais uma prova de sua desonestidade, mostrando não ser merecedor de nenhum crédito”.

Ele disse que várias empresas, além da Davati, fizeram abordagens semelhantes ao Ministério da Saúde – prometendo vacinas sem ter carta de representação dos fabricantes – com o objetivo de conseguir uma carta de intenções do governo brasileiro para comprar estes produtos no exterior. “Quando pega carta de intenção do governo brasileiro, ele se cacifa”, afirmou.

ENVOLVIMENTO DE MIRANDA

Dias também questionou o envolvimento do deputado federal Luis Miranda (DEM-DF) nas denúncias a respeito de compra de vacinas e sua ligação com a Davati. Isto porque Dominguetti apresentou à CPI um áudio do deputado em que ele aparece negociando produtos não especificados com a Davati.

Antes disso, Miranda chegou a ser ouvido pela CPI e disse ter avisado a Bolsonaro que seu irmão, Luis Ricardo, servidor do Ministério da Saúde, sofreu “pressão” para autorizar pagamento à empresa que intermediou a compra de 20 milhões de doses da vacina Covaxin. O presidente Bolsonaro teria dito ao deputado que acionaria a Polícia Federal para investigar, e vinculado o deputado federal Ricardo Barros (PP-PR), líder do governo na Câmara, às irregularidades.

“Causa estranheza que tais eventos que aparentemente não possuíam nenhuma correlação comecem a se interligar conforme os fatos que seguem”, disse Dias hoje à CPI. “Deputado disse que não comercializava produtos para saúde. Negou sob compromisso de não mentir para a CPI ter negócios neste ramo. Mentiu”. Dias afirmou, citando o áudio exibido à CPI por Dominguetti, que Miranda “possuía contato indireto com senhor Cristiano desde setembro de 2020”.

“É estranho depreender que todas as acusações se ligam ao deputado Luis Miranda. A grande verdade é que estou sendo vítima de ataques contra minha honra sem que nada tenha sido provado. Só se pode provar aquilo que é feito, e como nunca fiz, não será provado. Teria eu atrapalhado algum negócio do ilustre deputado?”, disse Dias.

Veja a íntegra da reunião abaixo: