Payroll parece forte, mas especialistas acham que isso não muda perspectiva do Fed

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Nota de dólar // Créditos: Pexels/Karolina Grabowska

São Paulo – A economia norte-americana ainda mostra resiliência, mas isso não deve mudar, por enquanto, a decisão do Federal Reserve (Fed, o banco central norte-americano) de pausar a alta das taxas de juros, dizem especialistas consultados pela Agência CMA.

Os dados de emprego divulgados mais cedo pelo Departamento do Trabalho dos Estados Unidos mostram, no entanto, que a possibilidade de arrefecimento na política monetária está longe.

A economia dos Estados Unidos criou 253 mil vagas de trabalho em abril e a taxa de desemprego caiu para 3,4%, de 3,5% em março. O número de criação de vagas veio acima da projeção dos analistas, que esperavam 180 mil novos postos de trabalho. Já a taxa de desemprego veio abaixo da previsão de 3,6%.

REVISÕES E DILUIÇÃO DE NÚMEROS

O número veio surpreendentemente forte, mas ainda assim não conta a história inteira. “A primeira impressão do payroll pode ser errônea, já que os números de março e fevereiro tiveram revisões significativas”, explica o economista-chefe da Nova Futura Investimentos, Nicolas Borsoi.

De acordo com o relatório, os números de março foram revisados em 71 mil vagas a menos do que originalmente divulgado, passando de 236 mil para 165 mil. Em fevereiro, o número foi reduzido em 63 mil, indo de 311 mil para 248 mil.

Como resultado, o ganho médio de folha de pagamento de três meses caiu para 222 mil, o mais fraco desde janeiro de 2021.

“Apesar dessa diluição, é um relatório forte, com serviços gerando muito emprego e o setor industrial voltando a acrescentar vagas”, aponta Borsoi. Segundo ele, a taxa de desemprego de 3,4% é a mais baixa desde 1969.

Importante notar também que, apesar da crise bancária, as vagas no setor financeiro cresceram em 23 mil.

RENDAS EM FORTE ALTA

Borsoi destaca, no entanto, a maior pressão nos aumentos de renda. As estimativas eram de um crescimento mensal de 0,3% e anual de 4,2% nos salários médios por hora, mas o relatório mostrou que o aumento real mensal foi de quase 0,5% e no anual foi de 4,4%.

“Isso não está consistente com a meta de inflação do Fed hoje, o aumento anual precisaria estar em torno de 2%”, diz Borsoi.

O economista-chefe para Estados Unidos do Capital Economics, Andrew Hunter, acredita que o grande salto mensal pode ser explicado por uma distorção temporária do calendário, já que “os ganhos geralmente aumentam mais nos meses com um dia de fim de semana extra no período da pesquisa”.

“De qualquer forma, a taxa de crescimento anualizada trimestral ainda desacelerou, para 3,8%”, aponta.

RECESSÃO?

Para ele, o relatório pode estar começando a indicar uma recessão próxima. “Houve uma queda de 23 mil nas folhas de pagamento de trabalho temporária que, como na pesquisa anterior, sugerem uma desaceleração mais acentuada no crescimento geral de empregos”.

“Os números do mercado de trabalho tendem a ser os mais atrasados de todos os dados o que nos leva a obter sinais contraditórios nos pontos de virada”, destaca o economista-chefe internacional do ING, James Knightley.

“Apesar da força do relatório, as ofertas de emprego vêm caindo drasticamente e a taxa de demissões está não muito acima do pico pré-pandêmico”, aponta Hunter.

MANUTENÇÃO DA TAXA DO FED

Por isso, os especialistas acreditam que o Fed deve manter a taxa em 5,0% e 5,25% mesmo após os últimos dados.

“Achamos que é uma questão de tempo até que uma desaceleração mais ampla do crescimento salarial ocorra”, completa o economista da Capital Economics.

“Os principais indicadores para a economia norte-americanas não são bons e os bancos estão apertando cada vez mais os padrões de empréstimo, o que sempre resulta em aumento do desemprego”, conta Knightley, já que empresas que dependem da linha de crédito podem quebrar mais fácil, resultando em demissões.

Borsoi aponta que mais dados importantes devem sair até a próxima decisão do Fed em junho. Entre eles um novo payroll. “Até lá, muito pode mudar, mas por enquanto não haverá mudança em sua decisão de manter as taxas”, afirma Borsoi.

Para ele, mais provável que um aumento nas taxas é o descarte completo da possibilidade de corte. “Ainda há pressão inflacionária, então para eles não é o momento de diminuir as taxas”, explica.

A ferramenta Fed Watch do CME que verifica a precificação dos próximos movimento do Fed no mercado comprova. Ontem, 9% acreditavam numa possibilidade de corte na próxima reunião. Hoje, nenhum participante parece crer nessa alternativa. Os que apostam em uma manutenção de nível cresceram de 90% para 95%.

Guilherme Sousa e Étore Sanchez, economistas da Ativa Investimentos, também mantém sua aposta na pausa de altas de taxas. “Entendemos que a decisão de manutenção de taxas parece precipitada à luz dos dados de hoje”, escrevem. “Mas com mais dados a serem observados, esperamos manutenção na próxima reunião”.