Iraque reduz dependência de EUA e abre espaço para rivais, dizem analistas

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Por Caroline Aragaki

São Paulo – A polêmica em torno da soberania do Iraque evidenciou a diminuição da dependência de Bagdá dos Estados Unidos em um movimento que abriu espaço para que rivais de Washington, entre eles Irã, Rússia e China, aumentassem sua influência na região, segundo analistas consultados pela Agência CMA.

“O Iraque se tornou um Estado totalmente dependente dos Estados Unidos a partir de 2003, mas nos últimos sete anos é possível ver novos atores na região: Irã, China e Rússia. Então, faz sentido o que está acontecendo nos últimos dias”, afirmou o professor de Relações Internacionais da Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM), Roberto Uebel.

Uebel se refere à decisão do parlamento do Iraque de retirar as tropas norte-americanas do país como resposta ao ataque aéreo feito pelos Estados Unidos em Bagdá no último dia 3, que matou o general iraniano Qassem Soleimani e foi realizado sem o conhecimento das autoridades iraquianas.

“A situação é muito complicada. O Iraque tenta equilibrar a vontade da população xiita do país, que se aproxima do Irã por questão religiosa, com a posição de aliado dos Estados Unidos”, afirma o professor de Relações Internacionais da Universidade Presbiteriana Mackenzie, Maurício Fronzaglia.

Como indicam os últimos acontecimentos, “caso o Iraque se distancie da esfera norte-americana e se aproxime do Irã, por tabela estará muito mais vinculado aos interesses da Rússia e da China”, disse o professor de Relações Internacionais da Fundação Armando Alvares Penteado (Faap), Vinicius Rodrigues Vieira.

Uebel, da ESPM, explica que “a China procura se aproximar do Iraque por conta do cinturão de acesso ao Oriente Médio, enquanto a Rússia – que está no centro do Oriente Médio – quer aumentar seu poder sob o território para ter maior controle no Golfo Pérsico, um ponto muito estratégico”.

A região concentra a maior parte da produção de petróleo do mundo e que se encontra com o Oceano Índico pelo estreito de Hormuz.

Para Fronzaglia, do Mackenzie, “a situação vai se resolver a partir da tomada de decisão dos Estados Unidos de acatar, ou não, o pedido de retirada das tropas”.

Washington e seus aliados, no entanto, não planejam se retirar do Iraque. Tanto o presidente norte-americano, Donald Trump, como o secretário de Defesa do país, Mark Esper, sinalizaram ontem que agora não é o momento de deixar o Iraque diante da possibilidade de aumento da influência do Irã na região.

As declarações acontecem após a divulgação do rascunho de uma carta na qual a coalização notificava Bagdá de que estava se preparando para deixar o Iraque, mas que não deveria ter sido enviada, como informou o chefe do Estado-Maior Conjunto dos Estados Unidos, Mark Milley.

No domingo, o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, ameaçou a imposição de sanções ao Iraque “como nunca viram antes” caso seja forçado a retirar suas tropas do país. “Temos uma base aérea extraordinariamente cara que está lá. Custou bilhões de dólares para construir. Nós não sairemos a menos que nos paguem por isso”, afirmou.

Essa base a qual Trump se referiu foi alvo de um ataque na noite de ontem pelas forças iranianas em resposta à morte de Soleimani.

A invasão dos Estados Unidos ao Iraque ocorreu em 2003, quando Saddam Hussein foi derrubado do poder. As tropas norte-americanas continuaram no país até 2011 com a justificativa de combater a violência. Em 2014, o governo norte-americano retornou para combater o Estado Islâmico, sob a autorização de Bagdá.

“No contexto atual, a presença de tropas norte-americanas só faria sentido para garantir a segurança interna mas, na prática, isso não acontece”, afirmou Vieira, da Faap.

De acordo com o professor, Trump não quer se envolver tanto com interesses internacionais. Em dezembro de 2018, o presidente norte-americano afirmou que
“os Estados Unidos não podem continuar a ser a polícia do mundo” em uma referência a ideia de que retiraria as tropas do Iraque.

“Inclusive, alguns analistas dizem que o ataque a Bagdá foi feito justamente para apresentar um problema que justificaria a retirada das tropas”, diz Vieira, ressaltando o desencontro de algumas informações, visto que agoraos Estados Unidos parecem recuar da ideia.