Discurso de Paulo Guedes puxa Bolsa para queda e dólar sobe na máxima histórica

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Por Danielle Fonseca e Flavya Pereira

São Paulo – O Ibovespa fechou em queda pelo segundo pregão seguido, com perdas de 1,25%, aos 107.059,40 pontos, sentindo os efeitos da forte volatilidade do dólar, que fechou em alta mesmo com dois leilões da moeda no mercado à vista e renovou recordes históricos após declarações do ministro da Economia, Paulo Guedes.

Segundo o ministro, é preciso se acostumar com um dólar mais alto, o que fez a divisa chegar a máxima de R$ 4,2770, reacendendo temores de impacto na inflação. O volume total negociado foi de R$ 26,7 bilhões.

“O mercado já estava estressado depois que Guedes falou ontem que o dólar alto não incomoda e hoje as falas também não foram nada boas. Estamos vendo uma correção de curto prazo do dólar depois disso”, disse o sócio da WM Manhattan, Pedro Henrique Rabelo.

Guedes disse que é preciso “se acostumar” com um dólar mais alto durante uma entrevista ontem nos Estados Unidos. Para ele, é natural a valorização da moeda em um ambiente de juros mais baixo e fiscal mais apertado.

Hoje, o ministro voltou a dar declarações que também não foram muito bem recebidas pelo mercado e disse que “o Brasil precisa aceitar que o governo não é motor de crescimento”, mas acredita que o País terá uma taxa de câmbio conversível em cinco ou seis anos. Com a forte alta após as falas, o BC anunciou dois leilões de venda de dólares, o que fez a moeda desacelerar ganhos.

“O Guedes vem fazendo um bom trabalho, mas falar que está confortável com o dólar forte e depois o BC intervir no mercado pode tirar a credibilidade da fala do ministro. Talvez seja melhor ele falar menos”, disse um operador de uma corretora nacional. Para o operador, embora as atuações do BC tenham deixado o mercado um pouco mais tranquilo, reduzindo o nível da moeda, podem não ser suficientes para eliminar os ruídos causados pelas declarações.

Entre as ações, assim como ontem, as do setor financeiro pesaram negativamente sobre o índice, caso do Itaú Unibanco (ITUB4 -2,04%) e da B3 (B3SA3 -2,65%), já que além de Guedes falar sobre o câmbio ontem, confirmou que estuda a tributação de dividendos, atualmente isentos, sendo que os bancos são grandes pagadores de dividendos.

Já as maiores quedas do Ibovespa foram da Azul (AZUL4 -4,33%) e da Gol (GOLL4 -4,24%). As companhias aéreas sentem a alta do dólar, já que a moeda afeta os preços de combustíveis, responsáveis por grande parte dos seus custos.

Na contramão, entre as maiores altas, ficaram as ações de se beneficiam do dólar forte por serem exportadoras, caso da CSN (CSNA3 3,81%) e da Gerdau (GGBR4 2,74%).

Com o foco no mercado de câmbio, a Bolsa brasileira se descolou do cenário externo, onde as bolsas norte-americanas fecharam com alta refletindo avanços nas negociações comerciais entre China e Estados Unidos.

Amanhã, na agenda, investidores devem acompanhar uma série de indicadores nos Estados Unidos, como a divulgação do PIB, dados de renda e pedidos de seguro-desemprego.

O dólar comercial fechou em alta de 0,61% no mercado à vista, cotado a R$ 4,2410 para venda, e renova a máxima histórica de fechamento pelo segundo pregão seguido reagindo às declarações d Guedes.

“Com essas palavras, investidores partiram para um desmonte de posições vendidas, o que levou a moeda a ser cotada acima da casa dos R$ 4,27 [chegou à máxima intraday histórica de 4,2770]”, comenta o gerente de mesa de câmbio da Correparti, Guilherme Esquelbek. O economista da Tendências Consultoria, Silvio Campos, avalia que “gerou ruídos” por ter vindo de uma “figura” como o ministro da Economia.

O patamar recorde levou o Banco Central (BC) a intervir no mercado em dois momentos, com a realização de operações pela manhã e pela tarde com a venda de dólares no mercado à vista ofertando lotes mínimos de US$ 1,0 bilhão – em cada operação. “Com isso, a divisa recuou para a casa dos R$ 4,23”, ressalta o gerente de câmbio.

À tarde, Guedes voltou a falar, porém, sem citar o mercado cambial. “O que acabou frustrando os mercados e fez com que a moeda voltasse a subir novamente, levando o BC a fazer o seu segundo leilão no mercado à vista”, diz. A segunda atuação da autoridade monetária levou a moeda a renovar a mínima do dia a R$ 4,2380 (+0,54%).

Amanhã, a agenda de indicadores estará pesada nos Estados Unidos com a divulgação da segunda leitura do Produto Interno Bruto (PIB) do terceiro trimestre nos Estados Unidos, além dos dados sobre renda e gastos pessoais. Tem ainda o relatório com a avaliação da situação econômica norte-americana, o Livro Bege.

Aqui, analistas ressaltam que “está difícil” prever os caminhos do câmbio. “Hoje o BC mostrou que está no mercado. É bom ficar atento porque ele pode voltar a atuar amanhã caso a moeda mantenha o viés altista”, destaca Campos.