Elcio Franco diz à CPI da covid que negociação com Butantan foi permanente

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O ex-secretário-executivo do Ministério da Saúde, coronel Antônio Elcio Franco Filho. (Foto: Marcos Oliveira / Agência Senado)

São Paulo – O ex-secretário executivo do Ministério da Saúde, Elcio Franco, repetiu o discurso do ex-ministro Eduardo Pazuello e disse que as negociações sobre a compra de vacinas contra a covid-19 desenvolvidas pela empresa chinesa Sinovac e envasadas no Brasil pelo Instituto Butantan foram permanentes. Ele defendeu esta versão apesar de haver vídeo em que ele, após veto do presidente Jair Bolsonaro às negociações, diz que “não há intenção de compra de vacina chinesa”.

Em outubro do ano passado, Pazuello anunciou a compra de 46 milhões de doses da CoronaVac. Um dia depois, Bolsonaro disse que havia mandado cancelar o acordo. “Já mandei cancelar, o presidente sou eu, não abro mão da minha autoridade”, disse ele na ocasião. Posteriormente, Bolsonaro publicou um vídeo ao lado de Pazuello – que na época estava com covid-19 -, em que o então ministro dizia que “um manda, o outro obedece”.

No mês passado, Pazuello disse à Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) do Senado que investiga erros e omissões do governo no combate à pandemia de covid-19 que o presidente Jair Bolsonaro nunca ordenou que fosse interrompido o processo de contratação e compra da CoronaVac, a vacina da Sinovac e do Butantan. Ele acrescentou que a declaração pública de Bolsonaro dizendo que iria mandar parar a contratação não foi transformada em ordem oficial.

“Nunca comunicou nada disso, Nunca falou para que eu não comprasse um ‘ai’ do Butantan. Ele falou publicamente. Para o ministério ou para mim, nunca. Até porque não tinha comprado nada, não podia comprar nada. Ele não me deu ordem para não comprar. Não foi formalizado porque nunca foi efetuada a ordem”, disse Pazuello em depoimento.

À CPI, Pazuello disse que o que havia sido assinado com o Butantan à época do anúncio da compra era uma carta de intenções, não um contrato. “Não poderia fazer o contrato, não tinha as disposições legais para fazer contrato ainda”, afirmou, acrescentando que as condições legais para a assinatura do contrato só puderam ser satisfeitas em janeiro deste ano com a aprovação de uma medida provisória.

Hoje, em audiência com a CPI, Elcio Franco – que foi o segundo no comando do Ministério da Saúde durante a gestão Pazuello – também disse que não recebeu nenhuma ordem direta para interromper as negociações, e que elas continuaram.

“Não houve cancelamento, foi feito divulgação pública de que vacinas seriam adquiridas desde que confirmadas segurança e eficácia pela Anvisa”, disse Franco. “Não recebi ordem para interromper, e elas continuaram. Mantivemos as negociações, e não há nenhum documento de intenção de não prosseguir nas negociações. A carta de intenções de 19 de outubro continuou vigente”, afirmou.

Ele manteve esta versão mesmo após a exibição de vídeo de 21 de outubro – ou seja, posterior à assinatura da carta de intenções – em que afirma não haver intenção de compra de “vacina chinesa”, uma referência ao imunizante da Sinovac e do Butantan. Também manteve esta versão após vídeo do diretor do Instituto Butantan, Dimas Covas, afirmando que as negociações foram interrompidas após a declaração de Bolsonaro de que ordenaria o cancelamento das tratativas.

ATRASO NA CONTRATAÇÃO

Franco também foi questionado pelos senadores a respeito do motivo pelo qual o Ministério da Saúde não firmou o contrato de compra da vacina do Butantan com a mesma antecedência com a qual adquiriu as vacinas contra a covid-19 produzidas pela AstraZeneca e a Universidade de Oxford.

O ex-secretário disse que a diferença de tratamento é decorrente de o contrato com a AstraZeneca ser uma encomenda tecnológica – que agregaria uma tecnologia nova de produção de vacinas e aumento da estrutura da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), responsável pelo envase da vacina da AstraZeneca no Brasil -, e que no caso do Butantan a tecnologia usada na vacina já existia, o que impossibilitava o mesmo tipo de tratamento.

“Informamos em diversas reuniões com o Butantan que não poderíamos usar a mesma ferramenta porque no caso da Fiocruz a encomenda tecnológica trazia solução inédita para problema. No caso do Butantan, era vacina de vírus inativado, tecnologia que próprio Dimas Covas nos informou que já domina.”

Franco também disse que a avaliação do Ministério da Saúde é de que havia riscos à compra das vacinas do Butantan porque ainda não havia os resultados da fase 3 do estudo clínico – segundo ele, considerado um “cemitério de vacinas”, pois havia chance de não ser comprovada a eficácia de fases anteriores do estudo.

O presidente da CPI, Omar Aziz (PSD-AM), contestou a avaliação de Franco, comparando a compra das vacinas à aquisição de um apartamento na planta, visto que em nenhum dos dois casos – AstraZeneca e Sinovac – havia garantia da eficácia dos imunizantes.

O acordo com a AstraZeneca foi anunciado em julho de 2020, bem antes de serem divulgados os resultados da fase 3 do

estudo clínico, em dezembro. O contrato com o Butantan foi assinado no início de janeiro, pouco antes da divulgação dos números sobre a eficácia da vacina da Sinovac.

Franco reconheceu que havia possibilidade de a encomenda tecnológica da AstraZeneca tinha “possibilidade de insucesso”, mas que “a vacina mais avançada daquele momento era a da AstraZeneca. No momento em que foi assinado o contrato, estava bem avançada e tinha grandes chances de sucesso”.

Assista abaixo a íntegra da reunião: