Com privatização mais distante, esperança é nome técnico para liderar Eletrobras

A saída de Wilson Ferreira Júnior da presidência da estatal evidenciou as dificuldades de privatização e o mercado espera, agora, um executivo que ao menos mantenha melhoras já obtidas

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Foto Divulgação/ Eletrobras

São Paulo – Após a saída de Wilson Ferreira Júnior da presidência da Eletrobras deixar as chances de uma privatização da estatal mais distantes, as esperanças do mercado se voltam para a escolha de um nome com capacidade técnica para liderar a empresa e que continue a defender o processo e os ganhos de eficiência já obtidos pela companhia na última administração. Um nome técnico e do mercado também afastaria receios sobre um loteamento de cargos em estatais, em um momento político delicado para o governo de Jair Bolsonaro.

Ao renunciar ao cargo no último domingo (24), Ferreira Júnior, que é grande defensor da venda da empresa, deixou claro que entre os motivos para a sua saída estavam a falta de tração do processo de privatização e as sinalizações de que ela não será prioridade no Congresso. Entre essas sinalizações, estão declarações do candidato do governo à presidência do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG). Porém, o presidente Jair Bolsonaro e o ministro da Economia, Paulo Guedes, já voltaram a defender privatizações e concessões em evento do Credit Suisse para investidores hoje, culpando os parlamentares pela falta de avanço da agenda.

“Já há muitas dúvidas no mercado sobre quem deve assumir o posto e, principalmente, se o governo irá fazer pressão para colocar um nome que sirva de capital político, visto que estamos próximo das eleições para presidente da Câmara”, disse o gerente de research da Ativa Investimentos, Pedro Serra. Além da disputa do Senado, a disputa pela presidência da Câmara dos Deputados tem se mostrado mais acirrada.

A avaliação da corretora é que a única possibilidade da Eletrobras conseguir reverter, em parte, o pessimismo que agora paira sobre a estatal, é a o conselho eleger, o mais rápido possível, um nome técnico, mas que, ao mesmo tempo, consiga bom trânsito no meio político.

A escolha do futuro presidente, porém, é responsabilidade do conselho de administração da Eletrobras, que contratou uma consultoria especializada em recrutamento de altos executivos. Serra lembra que o conselho atual é formado, em boa parte, por pessoas indicadas ainda no governo de Michel Temer e consideradas técnicas. “Essa será a verdadeira prova de fogo de independência desse conselho”, reiterou.

O conselho da Eletrobras é composto por 11 membros, seis deles indicados pelo governo. O atual presidente do conselho é Ruy Flaks Schneider, que assumiu o posto em dezembro do ano passado, indicado pelo governo Bolsonaro, e está entre os nomes cotados segundo reportagem do jornal “Valor Econômico”. Schneider é oficial da reserva da Marinha, mas já atuou no mercado em empresas como a Xerox do Brasil e o Banco Montreal (antigo Banco Brascan). Porém, o próprio Ferreira Junior chegou a comentar que não vê o presidente do conselho Ruy Schneider o sucedendo.

Os analistas do Bank of America são outros que veem a nomeação de um presidente com orientação técnica como “fundamental para a Eletrobras preservar o legado de Ferreira”, mas acreditam que as ações da empresa podem seguir pressionadas no curto prazo.

“Ferreira liderou o que consideramos ser uma recuperação operacional impressionante e o processo de desalavancagem na Eletrobras desde meados de 2016, incluindo o desinvestimento da distribuição de energia (R$ 3 a 4 bilhões), R$ 15 bilhões de VPL [valor presente líquido] de iniciativas de corte de custos e mais de R$ 2 bilhões em vendas de ativos não essenciais”, ressaltaram em relatório.

Já o analista da Guide Investimentos, Henrique Esteter, afirma que o governo sabe que qualquer tipo de interferência seria mal vista e ainda refletiria sobre outras estatais, lembrando que já houve rumores de que Bolsonaro queria demitir o presidente do Banco do Brasil, André Brandão, recentemente. Por isso, tem esperanças: “Pode ser que ainda venha um nome técnico. Ingerências podem trazer mau humor para outras estatais”, disse em live para clientes.

O analista do Bradesco BBI, Francisco Navarrete, também mantém expectativas de escolha de um executivo bem avaliado, já que acredita que grande parte da tese de investimento na Eletrobras depende, não apenas de expectativas de privatizações, mas de saber se as melhorias operacionais feitas na empresa nos últimos anos serão mantidas.

“Embora seja difícil trazer em um executivo do setor privado, há esperanças de que o governo nomeará alguém com formação técnica que possa manter o bom trabalho realizado pela administração de Wilson”, disse, em relatório.

“Em segundo lugar, temos que esperar o resultado das eleições do Congresso no início fevereiro”, completou, para avaliar melhor a possibilidade de uma privatização. Para Navarrete, talvez a venda da estatal ainda tenha chance, dada a necessidade de injetar recursos na economia e já que o processo poderia trazer até R$ 30 bilhões para o Tesouro Federal.

Porém, com o cenário atual de incerteza e deterioração nas perspectivas de privatização, afirma que investidores devem começar a precificar uma probabilidade maior de que a Eletrobras se torne uma “empresa estatal ruim”. Se mantendo os ganhos da última administração, avalia que o valor justo para o papel preferencial da Eletrobras (ELET6) seria de R$ 35,00, mas se voltar a ser uma estatal ruim, o valor justo estimado seria de R$ 27,00.

Na semana passada, o BBI já reduziu a recomendação para as ações para “neutral” (equivalente à manutenção), com preço-alvo de R$ 41,00, que implica 90% de probabilidade de ser uma boa estatal e 10% se tornar uma estatal ruim.

O BTG Pactual é outro banco que não descarta totalmente a chance de privatização da empresa e destaca que a empresa pode manter melhoras obtidas, como a maior previsibilidade de fluxo de caixa. Entretanto, considera os riscos de a Eletrobras de tornar o que chamou de “ação peso morto”, semelhante ao que acredita que ocorreu com a Sabesp, que também enfrenta entraves para uma privatização.

Já o Banco Safra preferiu reduzir a recomendação para as ações da Eletrobras de “neutral” diante da avaliação de as chances de venda caírem significativamente. “Após a renúncia do Sr. Ferreira, reduzimos a probabilidade de privatização para 20%. Assim, cortamos nossos preços-alvo para R$ 35,10 para a ELET3 (de R$ 53,8 anteriormente) e a R$ 36,70 para ELET6 (de R$ 55,30 anteriormente)”.