Choque de preços do petróleo deve forçar bancos centrais a agir, dizem analistas

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São Paulo – A derrocada dos preços do petróleo derivada da tensão entre a Arábia Saudita e a Rússia deve forçar os bancos centrais a fornecer mais acomodação para garantir o cumprimento das metas de inflação, segundo especialistas consultados pela Agência CMA.

“Os preços mais baixos da energia irão prejudicar a economia global e devem fazer que os bancos centrais sejam confrontados com a deflação, não com uma inflação”, disse o estrategista sênior do Rabobank, Michael Every.

O mercado já esperava uma ação coordenada dos bancos centrais diante dos potenciais efeitos do novo coronavírus na economia global. A primeira ação veio do Federal Reserve (Fed, o banco central norte-americano) na semana passada, quando promoveu um corte emergencial da taxa de juros de 0,50 ponto percentual (pp), passando-a para a faixa entre 1,00% e 1,25% ao ano.

Na sequência, o Banco do Canadá também reduziu sua taxa básica em 0,50 pp, passando-a para 1,25% ao ano, citando as chances de desaceleração da economia diante do surto do noco coronavírus.

Na quinta-feira, o Banco Central Europeu (BCE) se reúne para definir sua política monetária e apresentar projeções para a economia da zona do euro. No início do mês, a presidente do BCE, Christine Lagarde, havia afirmado em comunicado que estava pronta para agir se necessário para apoiar a inflação e a economia da região.

“Nas últimas semanas, observamos preocupações globais com o crescimento e com a inflação em um ambiente de surto do novo coronavírus e, mais recentemente, o desmantelamento da iniciativa da Opep significa que o mercado espera que o conselho do BCE supere qualquer relutância em colocar a taxa de depósito ainda mais em território negativo”, afirmou Every, do Rabobank.

Em janeiro, o BCE manteve a taxa básica de juros em zero, a taxa de depósitos em -0,5% ao ano e a taxa da linha mantida com bancos comerciais para concessão de liquidez de curto prazo em 0,25% ao ano. A próxima reunião de política monetária do BCE acontece no dia 12.

“Avaliar a duração do choque e a eficácia das medidas é importante para o BCE formular uma resposta política. Embora a política monetária não seja a melhor ferramenta para estabilizar a produção e a inflação sob um puro choque de oferta, o BCE será sensível a sinais de interrupção nos fluxos de crédito e financiamento”, disse o economista do Société Générale, Anatoli Annenkov.

PETRÓLEO EM QUEDA LIVRE

Os preços do petróleo chegaram a cair mais de 30% no início das negociações de hoje em reflexo ao fracasso da reunião da Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opep) e de seus aliados liderados pela Rússia na semana passada, em Viena.

Na ocasião, a Arábia Saudita propôs um corte adicional de 1,5 milhão de barris por dia (bpd) na oferta até o final do ano como uma resposta aos potenciais efeitos do surto do novo coronavírus sobre a demanda por energia.

Após dois dias de encontros, no entanto, a Rússia se recusou a fazer da iniciativa. A reação saudita foi imediata: o reino anunciou um aumento da produção e a venda de petróleo com descontos aos interessados. O resultado foi a derrubada de preços do petróleo, que fez o índice de commodities cair a níveis que não eram vistos desde a década de 1980.

“A Rússia e a Arábia Saudita devem conseguir resistir aos baixos preços do petróleo por algum tempo, permitindo aumentar a produção. Embora os produtores russos de petróleo possam se tornar não rentáveis com o preço atual do petróleo, o governo tem escopo para apoiá-los”, disse o economista chefe para mercados emergentes da Capital Economics, William Jackson.

“Acreditamos que alguns países, entre eles Arábia Saudita e Rússia, devem afrouxar suas políticas para nãos erem prejudicados nos próximos meses com a queda dos preços do petróleo”, acrescentou.