Bolsa fecha em queda e dólar em alta com influência de Wall Street

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Foto: Myles Davidson / freeimages.com

São Paulo – O Ibovespa acentuou a queda observada desde o início da tarde e encerrou o dia perto das mínimas do pregão acompanhando o movimento dos principais índices de ações de Wall Street. O resultado de hoje apagou totalmente a alta acumulada pelo índice até ontem em fevereiro e a bolsa irá para a última sessão do mês, amanhã, abaixo do nível em que encerrou janeiro.

Na bolsa de Nova York, a alta das taxas de retorno dos títulos da dívida norte-americana, em especial daqueles com vencimento em dez anos, afastou os investidores dos mercados de ações e os empurrou para as commodities em meio a temores de que a retomada da atividade econômica provoque uma pressão inflacionária mais forte que a esperada.

Antes da abertura, Pedro Galdi, analista da Mirae Asset, antecipou que a expectativa era de que o Ibovespa acompanhasse a fraqueza de outros índices hoje. Com isso, o Ibovespa fechou em queda de 2,94%, aos 112.256,36 pontos. O indicador futuro do Ibovespa com vencimento em abril acompanhou o movimento do índice à vista.

No cenário local, os investidores repercutiram pela manhã o surpreendente resultado da Petrobras no quarto trimestre de 2020. Contrariando projeções de prejuízo no período, o lucro líquido da estatal brasileira de petróleo saltou 634% nos últimos três meses do ano passado. O resultado assegurou um lucro de R$ 7,1 bilhões no acumulado de 2020.

Depois da forte alta pela manhã, entretanto, os papéis da companhia passaram a cair na parte da tarde, com os investidores deixando de lado a possibilidade de recuperação do terreno perdido pelas ações da empresa – um quarto de seu valor de mercado – entre o fim da semana passada e o início desta, quando os agentes do mercado financeiro repercutiram a intenção do presidente Jair Bolsonaro de conduzir o general da reserva Joaquim Silva e Luna à presidência da Petrobras.

A virada para baixo começou depois de Bolsonaro ter cobrado previsibilidade dos preços de combustíveis pela Petrobras. O movimento arrastou junto o Ibovespa. Além da fala de Bolsonaro, analistas consideram que o resultado trimestral evidencia ainda mais a motivação política por trás da ação do presidente, incomodado com a perda de popularidade diante da forte alta nos preços dos combustíveis nas últimas semanas, do comportamento do governo em relação à pandemia e da suspensão do auxílio emergencial.

O dólar comercial fechou em forte alta de 1,67% no mercado à vista, cotado a R$ 5,5110 para venda, no maior valor de fechamento do ano, em dia de forte estresse na curva de juros futuros dos Estados Unidos, as treasuries, com o título de 10 anos chegando a 1,54%, o que provocou forte desvalorização de ativos globais como, principalmente, as moedas de países emergentes, com as principais perdendo valor entre 2% e 3%, como o peso mexicano.

“Os juros saltaram nos Estados Unidos com nova rodada de preocupação com a ‘reflação’, que seria resultado do pacote fiscal democrata [de US$ 1,9 trilhão]. Vários analistas entendem que, passada a pandemia do novo coronavírus, transferências de renda emergenciais serão inflacionárias”, avalia o economista-chefe do banco Fator, José Francisco Gonçalves, acrescentando que os mercados têm estado instáveis nas últimas semanas.

Com o título de 10 anos no maior nível em um ano, desde o início da crise provocada pela pandemia, a economista-chefe da Veedha Investimentos, Camila Abdelmalack, acrescenta que o perfil “mais inclinado” à estímulos fiscais do presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, e com uma política de estímulo monetário adotada pelo Federal Reserve (Fed, o banco central norte-americano), levaram investidores a começarem a apostar em retomada da atividade econômica, porém, com um quadro de pressão inflacionária.

Ela destaca que o movimento de alta das treasuries, após o “derretimento” com o agravamento da crise, foi iniciado no último trimestre do ano. “Foi quando começou esse papo de ‘reflação’. Só que piorou nos últimos dias”, diz.

Com a moeda no maior patamar do ano, o Banco Central (BC) realizou os dois primeiros leilões de venda de dólares no mercado à vista de 2021, no qual colocou no mercado US$ 1,535 bilhão ao longo da tarde, mas com “pouco resultado”, diz o economista do Fator.

Abdelmalack reforça que a “percepção de risco” subiu muito no mercado doméstico, o que sustenta o dólar em patamar elevado. “Principalmente, com o episódio da Petrobras, refletindo em pressão no câmbio. Até por isso, o Banco Central entrou com leilão à vista e não de swap cambial [tradicional, equivalente à venda de dólar no mercado futuro] como vinha fazendo. Porque, além dos nossos problemas, foi uma pressão externa”, diz.

Amanhã, com a agenda de indicadores esvaziada, o destaque fica para os dados de janeiro sobre a renda e gastos pessoais nos Estados Unidos. Com o encerramento do mês, tem a tradicional disputa pela formação de preço da taxa Ptax – média das cotações apuradas pelo BC.

Para a economista da Veedha, “não há motivos locais” para uma melhora do real em relação ao dólar. “Com a disputa da Ptax, a tendência é muito mais de desvalorização da nossa moeda. Se alguma notícia lá de fora for positiva, pode ser que haja algum viés de melhora. Mas são poucos os fatores que possam sustentar uma recuperação da moeda amanhã”, finaliza.

As taxas dos contratos de juros futuros (DIs) encerraram a sessão em alta acelerada, incorporando prêmios de forma intensa, refletindo questões internas e externas. O salto no rendimento (yield) do título dos Estados Unidos de 10 anos (T-note) para a faixa de 1,50% pressionou a curva a termo local, que também foi pressionada pelas incertezas fiscais, em meio às negociações no Congresso sobre o auxílio emergencial.

Ao final da sessão regular, o DI para janeiro de 2022 ficou com taxa de 3,660%, de 3,515% no ajuste de ontem; o DI para janeiro de 2023 terminou projetando taxa de 5,46%, de 5,30% após o ajuste anterior; o DI para janeiro de 2025 encerrou em 7,17%, de 7,00% na véspera; e o DI para janeiro de 2027 tinha taxa de 7,84%, de 7,69%, na mesma comparação.

Os principais índices do mercado de ações norte-americano despencaram em meio a uma onda de vendas se espalhando além do setor de tecnologia e um aumento expressivo dos juros projetados pelos títulos de dívida de dez anos do Tesouro. Com isso, o Nasdaq teve a pior performance desde outubro.

Confira a pontuação e a variação dos índices de ações dos Estados Unidos no fechamento:

Dow Jones: -1,75%, 31.402,01 pontos

Nasdaq Composto: -3,52%, 13.119,40 pontos

S&P 500: -2,44%, 3.829,34 pontos