Bolsa atinge o menor nível em pontuação do ano com mudança no teto de gastos; dólar sobe

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São Paulo- A Bolsa fechou em queda de 2,75%, mas chegou a perder mais de 4% e mais de 5 mil pontos entre a mínima -105.713,81 pontos e máxima-110.767,14 pontos no interdiário, atingindo a pontuação da última semana de novembro de 2020-no patamar de 105.100 pontos com a notícia de que o de que o governo pretende mudar a metodologia do cálculo do teto de gastos para abrir um espaço extra no orçamento de 2022 de R$ 83,6 bilhões e o beneficio do Auxílio Brasil viria dessa manobra.
Outro ponto que contribuiu para o nervosismo do mercado foi o anúncio feito pelo presidente Jair Bolsonaro que criaria um auxílio para beneficiar os caminhoneiros autônomos com o objetivo de compensar o aumento no preço do diesel.
A aversão ao risco começou logo pela manhã com os investidores repercutindo as declarações da véspera do ministro da Economia, Paulo Guedes, afirmando que extrapolaria o teto de gastos com o benefício do Auxílio Brasil de R$ 400, tendo de pedir autorização ao Congresso para elevas as despesas em R$ 30 bilhões. Já o presidente da República reforçou, em evento hoje, que não vai romper a regra fiscal.
O principal índice da B3 caiu 2,87%, aos 107.597,95 pontos. O Ibovespa futuro com vencimento em dezembro perdeu 1,12%, aos 108.850 pontos. O volume financeiro foi de R$ 34,8 bilhões. Em Nova York, as bolsas fecharam de forma mista.
A grande maioria das ações que compõem o índice despencou hoje.
Segundo Luiz Henrique Wickert, analista sênior da plataforma de investimentos sim;paul, o principal motivo para a queda de mais de 4% na Bolsa foi a proposta de mudança na fórmula do teto de gastos para o ano que vem. “Essa alteração parece trivial, mas não é, existe uma quebra de regras e contratos que traz uma insegurança jurídica”.
Wickert explicou que a metodologia para calcular o teto de gastos públicos “antes era corrigido de junho a junho do ano seguinte e a proposta para 2022 é corrigir de janeiro até dezembro, período de inflação maior. Essa mudança adicionaria uma folga extra de R$ 40 bilhões e junto com a limitação de pagamento da PEC dos precatórios abriria um espaço de R$ 83,6 bilhões no orçamento no ano que vem, assim sairia o dinheiro para pagar o Auxílio Brasil de R$ 400 sairia “.
Rodrigo Marcatti, especialista e CEO da Veedha Investimentos, afirmou que a Bolsa sofre bastante reagindo à fala do ministro da Economia, Paulo Guedes, da véspera. “A perda do alicerce fiscal pode gerar mais gasto público, mais inflação levando a juros mais altos. Entramos em um ciclo já conhecido anteriormente”.
Marcatti comentou que o mercado apostava na equipe econômica e no ministro para segurar o ímpeto do governo e, “ontem, foi uma jogada de toalha, jogou o assunto para a política, tirou o time de campo como responsabilidade de conter esse aumento de furar o teto”.
Ele comentou que o ministro da Economia vem mudando o discurso em relação à ajuda à população mais vulnerável. “Não era comum ouvir essa retórica mostrando que está alinhado com o presidente, se vai furar o teto ou não é uma consequência do arranjo que vão tentar construir por meio dos precatórios”. O Congresso já quer aumentar mais o benefício de R$ 400 para até R$ 600. “Nada que é ruim que não pode piora”, enfatizou.
Cassio Bambirra, sócio da One Investimentos, comentou que o Ibovespa tem mais um dia de forte queda e caminha para fechar o mês no negativo com as incertezas políticas e o impacto na relação de preço/lucro dos papéis no índice.
“Todo esse temor é político com os ativos despencando e a Bolsa nada mais é que preço/lucro. Com o teto fiscal trazendo risco, a relação preço/lucro na Bolsa será menor e com isso as empresas que aparentavam estar muito baratas, não estarão mais porque a expectativa de juros está maior e a razão do preço lucro para justificar a compra de uma determinada ação vai ter de ser menor que antes. O preço justo do Ibovespa vai mudar se a gente continuar com essa dominância fiscal ruim”.
O dólar comercial fechou em R$ 5,6670, com alta de 1,88%. A sessão, que já começou tensa devido à fala do ministro da Economia, Paulo Guedes, que ontem afirmou ter “licença para gastar”, subiu ainda mais de temperatura após o presidente Jair Bolsonaro anunciar um auxílio emergencial aos caminhoneiros, além da manobra para recalcular o teto de gastos baseado no Indice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC).
De acordo com o executivo da REAG Investimentos, Antonio Machado, “o mercado já vinha com dúvidas sobre a credibilidade do arcabouço fiscal. Romper o teto retira não apenas a credibilidade, mas também a previsibilidade da política fiscal brasileira”.
Machado acredita que o país trilha um caminho sem volta: “Vamos precisar construir uma nova âncora fiscal, pois na prática o teto fiscal acabou”, sacramenta. Ele ainda fala sobre os planos de recalcular o teto baseado no INPC: “É um índice maior, por isso o Bolsonaro disse que não iriamos furar o teto. Mas isso ainda precisa ser aprovado”, explica.
De acordo com o economista-chefe do Banco Alfa, Luis Otávio Leal, “todo o arcabouço fiscal, no qual o mercado se baseava, está caindo”. Leal ainda explica o que é o teto fiscal: “Ele não é um número, mas um símbolo, algo educativo. A partir do momento em que você o torna imprevisível, ele perde a função”.
Para Leal não há dúvidas que todo este cenário de incertezas é precificado: “Não há previsibilidade para um investidor que, por exemplo, compra um papel de longo prazo, ele não tem garantias sobre se irá receber a quantia que lhe é devida”, analisa. “Até um mês atrás, você estava comprando o carro de um amigo, sabendo da procedência dele. Agora, este carro é de uma pessoa que você nunca viu. É claro que você não vai pagar o preço de antes, mas um valor muito menor”, metaforiza.
Para a economista e estrategista de câmbio do Banco Ourinvest, Cristiane Quartaroli, “o mercado já entendeu que a questão não é se o teto será furado, mas sim o tamanho deste rombo”. Ela revela que teme por medidas populistas que visem as eleições de 2022, piorando ainda mais a situação fiscal.
Quartaroli explica que, na sessão de hoje, todos os pares do real estão em queda, mas a moeda brasileira é a mais prejudicada, o que também reflete as incertezas globais: “A desaceleração nos Estados Unidos e China prejudica os emergentes, além do que eles são nossos principais parceiros comerciais. Vai ficando mais claro que o Federal Reserve (Fed, o banco central norte-americano) pode antecipar a alta dos juros”, prevê.
Assim como o dólar, as taxas dos contratos futuros de Depósito Interfinanceiro (DI) fecharam em alta após o presidente Jair Bolsonaro anunciar auxílio para os caminhoneiros autônomos do país. “Em torno de 750 mil caminhoneiros receberão uma ajuda para compensar o aumento do diesel”, afirmou Bolsonaro, sem detalhar a fonte do subsídio.
O DI para janeiro de 2022 tinha taxa de 7,886%, com máxima de 8,010%, de 7,632% no ajuste anterior; o DI para janeiro de 2023 projetava taxa de 10,480%, com máxima de 10,865%, de 9,900%; o DI para janeiro de 2025 ia a 11,490%, com máxima de 11,810%, de 10,900% antes e o DI para janeiro de 2027 com taxa de 11,800%, com máxima de 12,050%, de 11,270%, na mesma comparação.
Os principais índices do mercado de ações norte-americano fecharam em alta, com o S&P 500 alcançando seu primeiro fechamento recorde desde 2 de setembro, em um momento no qual os investidores seguem empolgados com os resultados das empresas no terceiro trimestre. A exceção foi o Dow Jones, que terminou próximo da estabilidade, com leve variação negativa. Confira a variação e a pontuação dos índices de ações dos Estados Unidos no fechamento:
Dow Jones: -0,02%, 35.603,08 pontos
Nasdaq Composto: +0,62%, 15.215,70 pontos
S&P 500: +0,29%, 4.549,78 pontos