BIS propõe considerar bitcoin e outras criptomoedas como de altíssimo risco

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Foto: Roger Brown / Pexels

São Paulo – O Banco de Compensações Internacionais (Bank of International Settlements, BIS) abriu uma consulta pública a respeito de uma proposta preliminar para definir quais critérios regulatórios os bancos devem aplicar a criptoativos aos quais tenham exposição. A proposta prevê que moedas como o bitcoin terão de ser consideradas de altíssimo risco.

A consulta pública, que colherá opiniões até 10 de setembro, é importante porque é o BIS é quem estabelece as diretrizes para a regulação bancária mundial.

A proposta divide os criptoativos em dois grupos. No grupo 1, estarão aqueles que preenchem as condições de classificação atuais e podem ser submetidos a regras já existentes de fiscalização. Estão nesta lista ativos tradicionais que são transformados em “tokens” – algo similar a uma securitização, mas utilizando a tecnologia blockchain – e as chamadas “stablecoins” – criptomoedas atreladas a moedas emitidas por governos ou a outros ativos reais.

No grupo 2, seriam colocados os ativos que não correspondem à definição do grupo 1 – ou seja, criptomoedas como a bitcoin, totalmente desvinculadas de ativos reais. “Como estes oferecem riscos adicionais e maiores, estariam sujeitos a um novo tratamento prudencial conservador”, disse o BIS em nota.

Para estes ativos, os bancos terão de multiplicar a exposição por 1250%, segundo a proposta do BIS, o que significa na prática que terão de reservar um volume muito maior de capital em comparação a outros ativos para compensar o risco proporcionado pelas criptomoedas.

Isso porque os bancos multiplicam todas as suas exposições a ativos pelas respectivas taxas de ponderação pelo risco. Desta conta, a instituição financeira obtém o valor dos ativos ponderados pelo risco. Quanto maior o valor, mais capital o banco precisa deter para ficar dentro dos padrões regulatórios.

A ponderação de 1.250% é a maior existente no âmbito das regras de Basileia. Para fins de comparação, no Brasil, a ponderação dos depósitos bancários à vista é de 20%, a dos empréstimos para pessoas físicas é de 75%, a de títulos de dívida de outros países com nota de crédito inferior a ‘B-‘ – considerados com maior chance de calote – é de 150% e a de alguns créditos tributários é de 300%.

A ponderação de 1.250% por aqui é aplicável a participações dos bancos em fundos de garantia mutualizados de câmaras ou prestadores de serviços de compensação e de liquidação em entidades não consideradas contraparte central qualificada.

O BIS argumentou que os bancos atualmente possuem pouca exposição a criptomoedas, mas que “o crescimento contínuo e a inovação nos criptoativos e serviços relacionados, aliados ao interesse elevado de alguns bancos, pode aumentar as preocupações com a estabilidade financeira global e os riscos ao sistema bancário na ausência de tratamento prudencial específico”.

Segundo Fabio Alves Moura, sócio-diretor da consultoria jurídica AMX Law, focada em blockchain, a consulta pública do BIS é um sinal positivo para o mercado de criptoativos, porque aborda um tema que hoje está à margem da regulação. “Sinaliza um pouco o tratamento institucional mais robusto desta classe de ativos”, afirmou ele em entrevista à Agência CMA.

Uma vez implementada uma regra que trate da ponderação de risco dos criptoativos, os gestores de fundos e instituições financeiras terão um protocolo prudencial e, consequentemente, mais segurança jurídica para tratar destes investimentos, afirmou.

Moura considera que a consulta pública do BIS deve caminhar para classificar os criptoativos desvinculados de ativos reais como sendo de alto risco, mas que pode haver discussões sobre como diferenciar os integrantes deste grupo, pois há criptoativos desta classe com mais liquidez e estrutura do que outros.

“Tem uma chance razoável de que [a ponderação de risco dos ativos do grupo dois] seja classificada desta forma [no patamar máximo]. Primeiro porque o BIS tem influência grande dos bancos tradicionais, nos quais a posição majoritária ainda é essa, de classificar cripto como ativos de alto risco, e segundo porque eles são de alto risco mesmo.”

Ele ressalta, porém, que há diferenças entre uma criptomoeda recém-lançada – que não tem volume de mercado -, e outras já estabelecidas, como a bitcoin – que possui um giro financeiro significativo e um histórico de funcionamento que a torna uma criptomoeda consolidada -, ou a ethereum – que opera dentro de um sistema microeconômico próprio e tem uma quantidade alta de empresas em sua rede.

“Ainda que não consiga visualizar de forma tão direta a conexão destas moedas com o mundo real, existe correlação”, afirmou.


Esta reportagem foi atualizada às 14h26 de 10 de junho para incluir comentários de Fabio Alves Moura, sócio-diretor da consultoria jurídica AMX Law.