BC ainda avalia vantagem de moeda digital após adoção do Pix

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Presidente do Banco Central do Brasil, Roberto Campos Neto, participa da Comissão de Assuntos Econômicos (CAE), no Senado Federal, em Brasília. (Foto: Raphael Ribeiro/BCB)

São Paulo – O Banco Central (BC) ainda avalia as vantagens de se adotar uma moeda digital no Brasil levando em consideração que hoje é possível fazer transações digitais e em tempo real com o Pix, o sistema de pagamentos instantâneos da instituição.

Em um evento promovido pela eB Capital, o presidente do BC, Roberto Campos Neto, mencionou que em outros países onde se avalia a possibilidade de emissão de moedas digitais pelos bancos centrais, a motivação é essencialmente centralizar as operações digitais – caso da China, “onde não tem um Pix, tem vários” – ou propagar o pagamento digital.

“No Brasil não temos esse problema [fragmentação de mercado] porque fizemos o Pix para evitar que isso acontecesse”, disse Campos Neto.

Ele acrescentou no entanto que desenvolver uma moeda digital pode ser algo útil no futuro para lidar com a chamada tokenização – transformação de títulos e ativos em blocos numéricos.

“Isso é um network que, independentemente de as pessoas gostarem ou não, network é proveitoso. Vai se viver com abundância de smart contracts. A moeda digital se encaixa melhor do que moeda física. Tem vantagem no futuro”, afirmou.

Ele reiterou que ainda há outras dúvidas a respeito das moedas digitais que ainda estão sendo discutidas pelos bancos centrais.

Ele citou como exemplo a discussão em torno da equivalência das moedas digitais com as físicas. “Os bancos centrais têm dito que a moeda digital é uma expansão da moeda física, então tem o mesmo valor da moeda física. Se isto é verdade, se é extensão da moeda física, teria que abrir para conversão total”, disse o presidente do BC.

Isso seria inviável na prática, porque geraria um problema para os bancos, que sofreriam para devolver o chamado multiplicador bancário – a parte do dinheiro que as instituições financeiras pegam dos correntistas para fazer financiamentos.

“Então, se não pode [fazer a conversão imediata], vai ter que restringir [a oferta de moeda digital]”, o que pode deixar o valor dela mais alto que o da moeda física se houver aumento na demanda, afirmou.

Mais cedo, o BC divulgou as diretrizes para uma potencial moeda virtual do Brasil, e entre elas está a possibilidade uso no varejo e a ausência de remuneração – a exemplo do que acontece hoje com a moeda física. Em nota, a instituição destacou que as diretrizes fazem parte de uma avaliação preliminar e levam em consideração discussões mantidas no Grupo de Trabalho Interdepartamental (GTI) da instituição voltada a analisar a hipótese de emissão de uma moeda digital.

A lista de diretrizes é composta por:

  • ênfase na possibilidade de desenvolvimento de modelos inovadores a partir de evoluções tecnológicas, como contratos inteligentes (smart contracts), internet das coisas (IoT) e dinheiro programável
  • previsão de uso em pagamentos de varejo <> capacidade para realizar operações online e eventualmente operações offline;
  • emissão pelo BC, como uma extensão da moeda física, com a distribuição ao público intermediada por custodiantes do Sistema Financeiro Nacional (SFN) e do Sistema de Pagamentos Brasileiro (SPB)
  • ausência de remuneração
  • garantia da segurança jurídica em suas operações
  • aderência a todos os princípios e regras de privacidade e segurança determinados, em especial, pela Lei Complementar n 105, de 2001 (sigilo bancário), e pela Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais
  • desenho tecnológico que permita integral atendimento às recomendações internacionais e normas legais sobre prevenção à lavagem de dinheiro, ao financiamento do terrorismo e ao financiamento da proliferação de armas de destruição em massa, inclusive em cumprimento a ordens judiciais para rastrear operações ilícitas
  • adoção de solução que permita interoperabilidade e integração visando à realização de pagamentos transfronteiriços;
  • adoção de padrões de resiliência e segurança cibernética equivalentes aos aplicáveis a infraestruturas críticas do mercado financeiro.

Na nota, o BC afirma ser “importante aprofundar a discussão do assunto, incluindo o diálogo com o setor privado” e que é preciso fazer isto antes de apresentar um cronograma de implantação.

“É importante ressaltar que as diretrizes aqui apresentadas tratam do entendimento atual do BC em relação ao tema, a fim de direcionar a discussão no âmbito nacional. Dados o estágio e a dinâmica das discussões e dos desenvolvimentos sobre o tema em nível mundial, o BC poderá reavaliar seu posicionamento à medida em que as discussões evoluam”.